Instituições debatem sobre os desafios para a governança e segurança hídrica no Brasil

28/10/2021 - 10:28

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) participou durante, a noite da última terça-feira (26), da palestra “Desafios para a governança e segurança hídrica no Brasil” promovida pelo Fórum Brasileiro de Gestão Ambiental (FBGA), em parceria com o Observatório da Governança das Águas (OGA) e com a Fundação SOS Mata Atlântica

O encontro virtual reuniu o secretário executivo da OGA Brasil, Angelo Lima, a coordenadora adjunta do Fórum Nacional dos Comitês de Bacia, Valéria Borges, o representante dos CBHs Interestaduais no Conselho Nacional de Recursos Hídricos e coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco do CBHSF, Anivaldo Miranda, a diretora de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, e a integrante da OGA Brasil, Fátima Casarin, especialista em Regulação e Gestão das Águas.

Aberto pelo secretário executivo da OGA Brasil, Angelo Lima, o debate foi iniciado lembrando que a OGA, que tem a missão de monitorar a governança e a gestão dos recursos hídricos no Brasil, está apresentando o Protocolo de Monitoramento da Governança das Águas em diversas instâncias e comitês. Segundo a OGA, 11 comitês já aderiram ao protocolo que tem o objetivo de tornar mais precisas e transparentes as medidas tomadas pelas instituições/organismos participantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Brasil (SINGREH), servindo como uma ferramenta para facilitar o trabalho dos integrantes do SINGREH no que se refere a suas políticas para as águas e a forma como vêm sendo aplicadas, avaliando em suas ações o que funciona ou não e fornecendo elementos para a elaboração de planos de ação.

Levando ao debate os desafios para a governança, a diretora de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, descreveu o momento como a “década de restauração dos ecossistemas”.

“Estamos há uma semana da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021, também conhecida como COP26, importante encontro da Organização das Nações Unidas (ONU) para abordar o desafio da emergência climática que estamos vivendo, e a água é um dos elementos da natureza que melhor espelha para a sociedade os impactos do clima, seja por seca extrema, escassez hídrica, temporais e chuvas extremas. Além da crise institucional que enfrentamos e perda de espaço de participação da sociedade e das organizações na tomada de decisão dos nossos governos, o que impacta diretamente a governança”. 

O debate pontuou sobre o desafio urgente de conter o desmatamento das florestas, as queimadas sobre áreas úmidas do pantanal, por exemplo, além de não permitir que a água no Brasil seja priorizada somente para um determinado uso.

A coordenadora adjunta do Fórum Nacional dos Comitês de Bacia, Valéria Borges Vaz, pontuou sobre os desafios que os comitês enfrentam sob a perspectiva do seu fortalecimento. “Temos muitos desafios e cada vez são maiores. Do ponto de vista dos comitês, uma questão é o fortalecimento e reconhecimento destes órgãos como importantes tomadores de decisões pois reúnem usuários, população e governos, para cumprir realmente nossa função”.

Embora a cobrança pelo uso da água esteja prevista pela Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei nº 9.433/97, apenas seis Estados têm instituída a cobrança pelo uso da água. O objetivo é obter verba para a recuperação das bacias hidrográficas brasileiras, estimular o investimento em despoluição, dar ao usuário uma sugestão do real valor da água e incentivar a utilização de tecnologias limpas e poupadoras de recursos hídricos. Todos e quaisquer usuários que captem, lancem efluentes ou realizem usos não consuntivos diretamente em corpos de água necessitam cumprir com o valor estabelecido da cobrança.

Para o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco do CBHSF e representante dos CBHs Interestaduais no Conselho Nacional de Recursos Hídricos, Anivaldo Miranda, sem acesso aos recursos oriundos da cobrança pelo uso da água, os comitês não têm muita possibilidade de avançar.

“Muitos estão se aproveitando do momento para tentar desmontar a política participativa. Vários Estados têm avançado nas competências dos comitês. Todos os parâmetros negativos em relação a essas políticas públicas se deterioraram gravemente assim como ficou deteriorada a níveis espantosos a degradação ambiental em nosso país. Agora vivemos um momento em que a mídia brasileira e a opinião pública caiu na armadilha de ficar repetindo que temos atualmente uma crise hídrica no Brasil, apenas. De fato, pode-se dizer que temos uma crise hídrica, mas fica a impressão de que é apenas uma crise da escassez de água nos grandes reservatórios geradores de energia nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, mas é muito mais apropriado dizer que estamos enfrentando uma crise hidro energética. Porque quando se fala crise hídrica, esconde-se de alguma forma, que há poderosos interesses por trás disso. O fato é que estamos vivendo uma crise energética que retroalimenta aquilo que se chama de crise hídrica e a responsabilidade é do setor elétrico e, de maneira mais ampla, do poder Público Federal do Brasil que não se planejou desde 2001 onde o governo recebeu alertas com aquele apagão e em 20 anos não tomou as medidas necessárias para diversificar a matriz energética no Brasil”, afirmou Miranda, acrescentando: “É claro que temos os efeitos da mudança climática, mas o essencial ainda é a crise de governança que resulta na queima de florestas, desmatamento dos biomas, desorganização da chuva no território brasileiro e nesse coquetel indesejado, é trágico o que estamos vivendo”.

Especialista em Regulação e Gestão das Águas, Fátima Casarin concluiu alertando sobre os impactos da Medida Provisória 1.055, de 28 de junho de 2021 (MP 1055). “A MP 1055 impacta o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e principalmente a governança das águas. A MP inverte o papel regulador/regulado sobrepondo às prerrogativas da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). É um projeto de desmonte na verdade”.

O secretário executivo da OGA Brasil, Angelo Lima, encerrou o debate lembrando ainda que o Observatório da Governança das Águas, juntamente com diversas instituições, iniciou um chamado à ação para enfrentar a crise hídrica propondo ações que visam a garantia do abastecimento de água às populações humanas como item prioritário na agenda de alocação dos recursos hídricos, norteada pelos princípios da igualdade, equidade, acessibilidade financeira e não discriminação; instar a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) para publicar o quanto antes a “Norma de referência sobre medidas de emergência e contingência, inclusive racionamento”, prevista na Lei 14.026/2020, que alterou o marco legal do saneamento; mobilizar os Sistemas Nacional e Estaduais de Gerenciamento de Recursos Hídricos, em especial os Comitês de Bacia Hidrográfica, para a construção de ações preventivas e de planejamento para eventuais restrições de usos da água; exigir dos governos federal, estaduais e municipais a máxima transparência das informações sobre a crise hídrica para toda a sociedade, com ampla participação dos entes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH), principalmente os Comitês de Bacias, tanto para o enfrentamento da crise atual quanto para a prevenção e preparação proativa de futuras crises.

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Juciana Cavalcante
*Foto: Kel Dourado