As lideranças reunidas no II Seminário de Povos Indígenas da Bacia do São Francisco, em Petrolândia (PE) repudiaram a Portaria 303\2012 da Advocacia Geral da União – AGU, editada no último dia 16 de julho, que dispõe sobre as salvaguardas institucionais para as terras indígenas. A moção de repúdio, considerando a medida “arbitrária e inconstitucional”, foi aprovada, por unanimidade, no encerramento do encontro, neste domingo (23.9) por representantes de 16 etnias, que habitam territórios em Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais.
A portaria relativiza o usufruto das riquezas do solo, rios e lagos das terras indígenas quando houver “relevante interesse público da União”, estabelecendo que o usufruto indígena não abrange o aproveitamento dos recursos hídricos e potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra de riquezas minerais, fixando ainda que a instalação de bases e intervenções militares, a expansão da malha viária e a exploração de alternativas energéticas serão implementadas independente de consulta às comunidades indígenas ou à Funai. A portaria também veda a ampliação da terra indígena já demarcada.
A leitura da portaria provocou reações de protesto entre os representantes indígenas. “Isso vai acabar com o povo indígena, se a gente ficar acomodado”, alertaram primeiramente algumas lideranças mais antigas. Os pronunciamentos que se seguiram foram de conclamação para que os povos indígenas de todo o país se mobilizem para pressionar o governo federal a rever a decisão.
Dois dias depois da publicação, a portaria foi repudiada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib, que em nota oficial afirmou que “esse tratamento dado aos povos indígenas não tem cabimento num Estado democrático de direito”, assinalando que se o governo federal insistir na aplicabilidade dos instrumentos jurídicos que “legalizam a usurpação dos direitos indígenas, principalmente o direito sagrado à terra e ao território, estará notoriamente desvirtuando e tirando a credibilidade de seus propósitos”.
Em seguida, por meio de nota técnica, também a Funai manifestou a sua “contrariedade” com a portaria, considerando que “a medida restringe o reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, especialmente os direitos territoriais, consagrados pela Constituição Federal, ao adotar como parâmetro decisão não definitiva do Supremo Tribunal Federal”, alertando ainda que a iniciativa pode “aumentar a insegurança jurídica e, principalmente, colocar em risco os direitos garantidos constitucionalmente às comunidades indígenas”.
Leia aqui a moção de repúdio dos povos indígenas do São Francisco
Escassez de água
No documento conclusivo aprovado no final do seminário, os participantes aprovaram indicações ao Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHSF para que também se pronuncie a respeito da portaria 303\2012, com base em parecer jurídico; para que empreenda gestões junto à Codevasf com vistas a assegurar o abastecimento hídrico aos povos indígenas que enfrentam escassez de água, embora vivam na bacia do rio São Francisco, e para que realize o III Seminário dos Povos Indígenas da Bacia do Rio São Francisco no ano de 2013, em terra dos Pataxó de Minas Gerais.
O seminário foi realizado pelo Comitê do São Francisco, com apoio da Associação de Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – Apoinme. Participaram do encontro representantes dos povos Tingui-Botó, Kariri Xocó, Xucuru Kariri, Pankararu, Entre Serras Pankararu, Koiupanká, Karuazu, Kaiankó, Fulni-ô, Karapotó Plak-ô, Tumbalalá, Tuxá São Francisco, Atikum de Rodelas, Pankará de Itacuruba, Jeripancó e Pataxó de Minas Gerais.
Na sua composição, o Comitê conta com dois representantes indígenas: Marcos Avilquis Campo, o Sabaru, do povo Tingui-Botó, de Alagoas, e Mezaque da Silva de Jesus, do povo Pataxó, de Minas Gerais.
Assessoria de Comunicação do CBHSF