Mobilização da sociedade muda discurso do governo de Minas Gerais e faz IEPHA determinar tombamento provisório da Serra do Curral

28/06/2022 - 12:55

A aprovação concedida em 30 de abril pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM – MG) ao projeto da mineradora Tamisa em plena Serra do Curral, divisa dos municípios de Belo Horizonte, Nova Lima e Sabará, acendeu um estopim.


Os cálculos da empresa preveem a extração, na primeira fase da exploração, de 31 milhões de toneladas de minério de ferro em 13 anos, numa área total de 101,24 hectares (mais de um milhão de metros quadrados), incluindo 41,27 hectares de Mata Atlântica condenados ao desmatamento.

Além de símbolo da capital mineira, eleita pelos belo-horizontinos em 1997, a Serra é patrimônio geográfico, histórico (com ruínas da época do Arraial de Curral d’El Rei), cultural e, sobretudo, natural e hídrico, abrigando ampla diversidade de fauna e flora, diversas unidades de conservação, um Corredor Ecológico (Espinhaço-Serra do Curral), vastas áreas de recarga hídrica e reservas estratégicas de água, depositada na esponja rochosa do minério. Tudo isso está ameaçado.

A reação da sociedade veio forte e depressa. Antes mesmo da votação do COPAM, já estava constituído o Movimento Tira o Pé da Minha Serra, que ganhou ruas e redes sociais e congrega ativistas, movimentos socioambientais, artísticos e organizações da sociedade civil.

Em maio, em Ouro Preto (MG), a 43ª Plenária do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) aprovou, por maioria, moção em defesa da Serra do Curral. Segundo o vice-presidente Marcus Vinícius Polignano, trata-se de um “patrimônio hídrico, cultural e histórico de BH e de toda a bacia do São Francisco que precisa ser preservado”. Para Polignano, “foi histórico o posicionamento do CBHSF pela proteção integral da Serra”.

Soando os tambores

A intensa repercussão chegou aos ouvidos do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), instituição que assessora a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O órgão expediu recomendação para que seja ampliado o perímetro tombado pelo governo federal em 1961 e efetivado o tombamento estadual da Serra do Curral, reconhecida pela Unesco, em 2005, como a sétima reserva brasileira da biosfera.

A Assembleia Legislativa também escutou os rufos e acelerou a tramitação de Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe o tombamento da Serra. A PEC teve parecer favorável da Comissão Especial neste último dia 21 e já pode ser votada em 1º turno pelo plenário.

O governo do estado sentiu o drama. Em 14 de junho, editou o decreto 48.443, em que “reconhece a Serra do Curral como bem de relevante interesse cultural do Estado de Minas Gerais”, cujo artigo 2º estabelece que “a Serra do Curral (…) poderá ser objeto de proteção específica, por meio de inventário, tombamento, registro, outras iniciativas e procedimentos administrativos pertinentes, a critério técnico dos órgãos e das entidades responsáveis pela política ambiental e de patrimônio cultural do Estado (…)”.

Cinco dias depois, foi a vez de o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico editar a Portaria 22/2022 e determinar a proteção provisória da Serra, em vigor “até que seja apreciada proposta de tombamento (…) pelo Conselho Estadual de Patrimônio Cultural – CONEP”, o que, segundo acordo com o Ministério Público, deve ocorrer até 30 de agosto.

O vice-presidente do CBHSF comemora – “Jogo é jogado. Até então estávamos tomando de 10 x 0, pelo menos empatamos” – e analisa: “A partir de toda a movimentação da sociedade, movimentos organizados, Comitês de Bacia do Velhas e do São Francisco, Projeto Manuelzão, o Tira o Pé da Minha Serra, ativistas, artistas e políticos, o governo, que vinha defendendo sistematicamente a mineração, servindo-lhe de anteparo, faz dois movimentos: o decreto mais resumido, onde reconhece a Serra por sua importância ecológica, histórica, hídrica, e o tombamento provisório, a que ele resistia. Houve uma mudança de comportamento, um reconhecimento formal”.

Polignano conclui: “Isso garante o resultado? Não, mas foi uma mudança no discurso. Pairam dúvidas sobre como fica a Tamisa, mas qualquer tentativa de mexer no local agora está absolutamente bloqueada por essa conjuntura. A luta continua por tudo que a Serra representa, a sociedade segue postulando o tombamento integral e vai ficar muito ruim se o governo voltar atrás, porque ele praticamente referendou o dossiê. Não há outro caminho”.


Assessoria de Comunicação do CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Fotos: Bianca Aun