Ciclo de baronesas em Paulo Afonso e Glória continua provocando graves prejuízos

16/04/2020 - 15:24

Suspensão do abastecimento de água, prejuízos na piscicultura e pesca artesanal, fechamento da grande maioria dos estabelecimentos às margens do Rio São Francisco, perdas no turismo, comprometimento do lazer. Essas são algumas das consequências sociais que a presença das baronesas, bioindicadoras da quantidade de matéria orgânica na água, tem provocado na região de Glória e Paulo Afonso, na Bahia.

Há pelo menos quatro anos a população que sobrevive de atividades ligadas ao uso do Rio São Francisco vem amargando prejuízos que ultrapassam a casa dos milhões. De acordo com a Associação Aquicultura do Rio São Francisco – PEIXE SF, o acumulado passa dos R$ 15 milhões nos diversos setores (piscicultura, turismo, captação de água). Em Glória, 27 pequenos (até 10 toneladas por mês) e médios (até 50 toneladas por mês) produtores já deixaram a piscicultura por não ter como repor a produção perdida. Além dos municípios de Jatobá, Belém de São Francisco e Itacuruba, em Pernambuco, que também passam pelo mesmo problema.

De acordo com o Ministério Público da Bahia, as questões da crise hídrica pela qual passou o Velho Chico, afetam as águas da Bacia do São Francisco, tanto em quantidade quanto em qualidade. A promotora de justiça Luciana Khoury destaca que o aparecimento de maior quantidade de macrófitas aquáticas, comprometendo o uso das águas para diversas finalidades teve maior expressão nos últimos anos. “As baronesastem ocorrido na região de Paulo Afonso e Glória após o longo período de estiagem enfrentado. No ano de 2019, chegaram informações da gravidade da situação. A presença das baronesas provocoumuitas consequências sociais desastrosas para a população,tais como a suspensão do abastecimento de água em povoados do município de Glória, impactos em muitas pisciculturas da região, em especial no povoado da Quixabá, também em Glória. Além disso, soubemos dealguns produtores que perderam toda a produção.Também houve impacto para os pescadores artesanais, que ficaram impedidos de pescar e o fechamento da grande maioria dos estabelecimentos da Prainha, em Paulo Afonso,respingando no turismo”, destacou.

Essa situação é reafirmada pelos produtores Ivan Lima Silva, mais conhecido como Pirão, e Lucas de Carvalho Gomes, que deixou de produzir por não ter mais forças para competir com o avanço das baronesas. Lucas, que trabalhava na área há oito anos, relata que em 2017 perdeu 30% da produção.Em 2018 e 2019, esse volume chegou a 40% e, este ano, a perda foi de 100% da produção. “Esse ano perdemos qualquer possibilidade de continuar. Com isso, são oito famílias desempregadas. A situação é desesperadora para muitos de nós”, afirmou.

Ao longo desse tempo foram realizadas audiências públicas convocadas por diversos atores da sociedade. E, em 2019, o MPBA realizou uma audiência com o objetivo de mapear os problemas e pactuar soluções. Como desdobramento desse encontro, foi assumidopor diversas entidades que contribuem de alguma maneira para as causas ou daqueles que possuem responsabilidade para a solução dos problemas, o polo ativo de Ação CivilPública para a adoção de providências. A ACP tramita na Justiça Federal. “Um outro desdobramento relevante é que foram levantados aspectos sobre a adequação da retirada mecânica das baronesas ou não, e isso foi discutido por vários especialistas que deram orientações, tendo a prefeitura de PauloAfonso, naquela época, investido em equipe e recursos para a retirada das baronesas na Prainha. Além disso, observou-se após sobrevoos feitos na região que grande parte das baronesas provém do Rio Moxotó e se concentram em locais de águas mais paradas como na Prainha (PauloAfonso), e Quixaba (Glória), sendo assim necessário aprofundar informações sobre a situação no Rio Moxotó”, destacou a promotora Luciana Khoury.

Nesse caso, foi sugerida a criação de uma equipe específica durante uma etapa de campo da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI Pernambuco) realizada em julho de 2019. A intenção do grupo foi mapear pontos de concentração das baronesas, lançamentos de esgotos não tratados, lançamentos de outros efluentes, presença de pisciculturasalém da área da Bahia e Pernambuco, e outros pontos em que foram identificados o uso de agrotóxicos e fertilizantes, possíveis causas que se somam às demais que contribuem para agravar a quantidade de matéria orgânica no Rio.


Veja fotos das baronesas que assolaram Paulo Afonso no ano passado: 


Saneamento Básico

A ausência de saneamento básico em muitas das cidades ao longo da Bacia do Rio São Francisco influência, de modo determinante, no despejo inadequado de esgoto nos rios. O MP ainda destaca que, de acordo com os apontamentos feitos durante as etapas da FPI na Bahia, o Núcleo de Defesa da Bacia do São Francisco (NUSF) elaborou diagnóstico onde foi detectado que, em 2017, 63% das obras sobre saneamento básico não foram concluídas ou não foram recebidas pelo prestador de serviço de saneamento básico.

“No que se refere às obras de esgotamento sanitário, existiram na Bahiaobras com apoio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em 47 municípios. Conferindo dados da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba(CODEVASF), Empresa Baiana de Águas e Saneamento (EMBASA), Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAEs) e com os municípios, os problemas para a não conclusão das obras foram desde as falhas de projetos, a projetos antigos, projetos que não dialogaram com o sistema de qualidade da Embasa e, por isso, não foram recebidos. Aquelas obras que não foram recebidas terminaram por precisar de novos investimentos para conclusão.

Através do NUSF e das Promotorias regionais ambientais, e da atuação com o MPF, foram realizadas reuniões com os órgãos para assegurar o términodas obras, e alguns casos o objetivo foi alcançado. Também foi feita recomendação conjunta para buscar assegurar a conclusão das obras antes de investir qualquer valor em outras iniciativas, bem como estão sendo tratadas caso a caso, a cobrança de conclusão de cada uma delas. O sistema de esgotamento sanitário de Paulo Afonso, por exemplo, tinha previsão de ser 100% feito pela CODEVASF. Ocorre que o projeto possuía falhas e não previa que o solo era pedregoso, com isso somente foi possível concluir 33% da obra. A EMBASA posteriormente investiu na construção de mais uma etapa e conseguiu alcançar a cobertura de 65% da sede municipal. Espera-se que sejam retomadas as obras e finalizadas, recebidas e o serviço prestado”, conclui a promotora.

Ela destacou ainda a atuação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco com o apoio às cidades para a execução do Plano Municipal de Saneamento Básico. “O Plano é um grande instrumento de planejamento para se alcançar a integralidade e a universalidade dos serviços de maneira progressiva, pactuando de maneira participativa com a sociedade. Tivemos grandes avanços com o apoio do Comitê que contemplou grande parte dos municípios dessa região, já tendo concluído alguns dos planos e outros estão em andamento.

A atuação do CBHSF e da Agência Peixe Vivo merece todos os aplausos do Ministério Público e da sociedade, pois esse instrumento é fundamental para uma adequada implementação da política de saneamento e, sem esse apoio, muitos municípios não teriam conseguido alcançar. Também alguns municípios foram apoiados com Programa da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) eInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA) sendo de grande relevância”.

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Azael Gois e Divulgação