A Diretoria do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) tomou conhecimento de modo informal, numa reunião conjunta entre a Diretoria Colegiada (DIREC CBHSF) e a Agência Peixe Vivo (APV) para discussão do Planejamento Orçamento Anual de 2025 (POA), que a Entidade Delegatária tinha sido comunicada pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) de que haveria uma mudança no processo de emissão de boletos da cobrança pelo uso da água pela entidade, que assim deixaria de ser boletado um ano fiscal e transferido para o ano seguinte a partir de autodeclaração dos usuários, criando-se um vácuo de arrecadação de um ano. Houve uma indignação geral, pois em nenhum momento a DIREC-CBHSF foi sondada ou informada sobre o fato.
Posteriormente, a presidência do CBHSF encaminhou um ofício à ANA que confirmou a “intenção-decisão” de fazer esta mudança sem que o Comitê fosse previamente consultado. Ora isto fere princípios básicos da autonomia do comitê previstos na Lei 9.433/1997 e no Contrato de Gestão 028/2020, assinado entre a ANA, a APV e o CBHSF.
A justificativa contida em ofício datado do dia 06 de novembro de 2024 para esta medida de tão drástico impacto é uma pretensa mudança na metodologia da cobrança que, além de se basear doravante em polêmico processo de autodeclaração dos usuários pagantes, será feita após o consumo das águas em cada exercício anual e não antes, conforme os limites da outorga e presunção de uso com o devido encontro de contas ao final de cada exercício, prática que funcionou normalmente até a presente data.
Na contramão da história, já se acumula uma inadimplência de mais de R$ 50.000.000,00 sem que a ANA tenha demonstrado uma capacidade real de cobrança conforme detectado pelo GT Inadimplência, criado pela Diretoria do CBHSF para avaliar o problema. Entendemos que, neste momento, uma medida de não boletagem por um ano somente agravaria o problema.
Por outro lado, seguindo recomendações da própria ANA, o Comitê, em função da melhoria de expertise da Agência Peixe Vivo, procurou incrementar nos anos anteriores, através do POA, uma efetivação maior na aplicação dos recursos existentes em caixa para que se chegasse a uma situação ideal de aplicar anualmente o valor arrecadado. Neste momento da história este equilíbrio de balancete se concretizou. Gastamos o que está previsto na arrecadação anual, ou seja, praticamente não existe um saldo excedente e por prudência a meta é manter 1,5 de arrecadação anual para os gastos previstos no POA.
Em outras palavras, não há saldo suficiente para que o CBHSF seja capaz de bancar um interstício de um ano sem o repasse, por parte da ANA, de recursos da cobrança pelo uso da água.
Se para a ANA a mudança proposta significa, por alguma razão, a padronização burocrática em sua tarefa obrigatória de órgão arrecadador, para o CBHSF, em contrapartida, redundará na necessidade de cortes altamente impactantes na execução dos seus projetos em andamento, na provável inviabilização de projetos já aprovados e com sinalização de execução já em 2025 e anos próximos, na inibição clara da necessária ampliação das ações do CBHSF com vistas às metas desafiantes do Plano Diretor de Gestão de Águas da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e maior compressão ainda no custeio, através de sua entidade delegatária, a Agência Peixe Vivo, das funções administrativas, financeiras e de planejamento, dentre outras, essenciais para a vida do CBHSF.
Com efeito, ao invés de utilizar o levantamento feito pelo CBHSF, com significativos recursos da cobrança, contendo as informações essenciais para a identificação de todas as numerosas e volumosas captações e lançamentos clandestinos ao longo das margens do rio São Francisco e que foram entregues à ANA há mais de 4 anos, o que permitiria o cadastramento e o aumento das receitas e atividades necessárias à consecução do Plano Diretor de Bacia, o que a este CBHSF está sendo sinalizado, em termos inequívocos, são medidas que claramente representam uma injustificável redução expressiva de aporte financeiro para o funcionamento do maior comitê de bacia hidrográfica do Brasil.
Diante do exposto, portanto, o CBHSF, reunido em sessão plenária na cidade de Petrolina, Pernambuco, escolheu responder de forma pública ao conteúdo do ofício nº 128/2024/SAS/ANA e afirmar da sua inequívoca rejeição à suspensão conforme anunciada e não discutida da cobrança pelo uso das águas do rio São Francisco pelo período de 12 meses, ao tempo que, se concretizado tal situação, afirmar igualmente que procurará os adequados meios institucionais, jurídicos e da cidadania para fazer valer sua autonomia e evitar a paralisação de suas atividades, acima de tudo fazer entender a ANA que é necessário alimentar intenso diálogo e convivência respeitosa e cooperativa com os comitês de bacia.
Diante do exposto, solicitamos a abertura de uma mesa de diálogo para que possamos explanar de forma mais clara os impactos incontornáveis que essa medida trará ao funcionamento do CBHSF.
Petrolina (PE), 12 dezembro de 2024
XLVIII Plenária Ordinária do CBHSF
*Foto: Edson Oliveira