Bispos da Bacia do Rio São Francisco emitiram Carta-Denúncia contra ameaças que o Velho Chico vem sofrendo

06/10/2020 - 17:19

Os bispos católicos da Bacia Hidrográfica do São Francisco emitiram no domingo (04), uma carta-denúncia para sobre três novas ameaças que o Velho Chico está sofrendo.

O documento assinado por nove bispos solicita às autoridades responsáveis em todos os níveis, que revejam suas decisões e medidas a cerca desses novos projetos.

“Nós, bispos católicos da Bacia Hidrográfica do São Francisco, neste dia de São Francisco de Assis e do rio que recebeu seu nome há 519 anos, nos sentimos, mais uma vez, compelidos a nos pronunciar sobre a situação em que se encontram o Rio e seu Povo. A promessa de vida trazida por Jesus não nos permite calar.

Ao final de 2017, publicamos a “Carta da Lapa”, alertando para a necessidade de medidas de revitalização da Bacia Hidrográfica. Desde então, não só estas medidas não foram tomadas e nem se anunciam – e são cada vez mais urgentes, como a situação tem piorado e promete piorar ainda mais. Pelo menos três novas ameaças identificamos:

1) A Usina Hidrelétrica – UHE Formoso. Esta nova usina está para ser construída na calha do rio, a 12 km a montante de Pirapora – MG, e alagar uma área de mais 32 mil hectares, em seis municípios, causando impactos ambientais e sociais desastrosos, que vão além do local e não estão sendo levados em conta. Os empreendedores e os governos federal e estadual aceleram o licenciamento da obra, em desrespeito às populações afetadas, entre as quais centenas de comunidades tradicionais ribeirinhas.

2) Uma Usina Nuclear – Está para ser implantada às margens do reservatório da Barragem de Itaparica, a Usina Nuclear de Itacuruba – PE. Anunciada há tempos, sinais recentes de sua concretização inquietam ainda mais as comunidades locais, já sofridas com as consequências da barragem que os expulsou da beira do Rio em 1987/88. As águas do Rio utilizadas para o resfriamento das caldeiras da usina ficarão contaminadas por radiação e elevadas a altíssimas temperaturas. Além do grande desequilíbrio a causar nos ecossistemas da região e a jusante do Rio, os riscos tenebrosos de um desastre nuclear afetarão uma região ainda maior.

3) Instrução Normativa no 67 – Preocupa-nos ainda esta Instrução Normativa de 3 de agosto de 2020, da Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União e da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados / Ministério da Economia, que trata da “demarcação de terrenos marginais, por meio da determinação da posição da Linha Média das Enchentes Ordinárias – LMEO e da Linha Limite dos Terrenos Marginais – LLTM” dos “lagos, rios e quaisquer correntes de água” federais. Chegam até nós apelos angustiados de comunidades tradicionais ribeirinhas do São Francisco, temerosas de que venham a perder para empreendedores privados as porções principais de seus territórios e o acesso ao Rio.

A produção de energia já compromete 70% da vazão do Rio São Francisco e é uma das principais causas de sua degradação. Não suportará estas novas agressões. É de se questionar o aumento incessante da demanda de energia elétrica e de novos territórios para produção, por um modelo de vida e civilização que está levando o planeta, nossa “Casa Comum”, à exaustão. As mudanças climáticas e as pandemias, cada vez mais intensas e rigorosas, que atingem sobretudo os mais pobres, estão aí a comprovar o fracasso do apregoado “desenvolvimento sustentável” ou de um pretenso “capitalismo verde”. Ao invés de serem manipuladas para o continuísmo do sistema, estão a exigir uma mudança radical dos rumos da humanidade, nos modos de produzir e consumir, em direção à “ecologia integral” que advogam, sensatamente, o Papa Francisco na “Laudato Si’” e o recente Sínodo da Amazônia.

A promessa de vida abundante anunciada por Jesus é nosso desafio e compromisso permanentes. Obriga-nos a esta denúncia e apelo. Às autoridades responsáveis em todos os níveis, pedimos encarecidamente que revejam suas decisões e medidas a cerca destes projetos, em vista do bem comum e da prioridade aos mais pobres, ao meio-ambiente, à vida, para além das pressões de interesses privados minoritários, agravantes da crise ecológica que a todos e tudo ameaça. À sociedade organizada, às pessoas de boa-vontade, sugerimos que tomem conhecimento destas situações e a defesa do bem maior, em apoio às comunidades afetadas, pressionando as autoridades. Às comunidades afetadas dizemos: fiquem firmes, defendam seus direitos e contem com nosso apoio!”

Bacia do Rio São Francisco, 04 de outubro de 2020.

Dom João Justino de Medeiros Silva – Arcebispo Metropolitano de Montes Claros – MG
Dom João Santos Cardoso – Bispo Diocesano de Bom Jesus da Lapa – BA
Presidente do Regional NE 3 da CNBB.
Dom Frei Carlos Alberto Breis Pereira, OFM – Bispo Diocesano de Juazeiro – BA,
Vice-Presidente do Regional NE 3 da CNBB.
Dom Vitor Agnaldo de Menezes – Bispo Diocesano de Propriá – SE,
Secretário do Regional NE 3 da CNBB.
Dom Roberto José da Silva – Bispo Diocesano de Janaúba – MG
Dom José Moreira da Silva – Bispo Diocesano de Januária – MG
Dom Tommaso Cascianelli, CP – Bispo Diocesano de Irecê – BA
Dom Gabriele Marchesi – Bispo Diocesano de Floresta – PE
Dom Frei Luiz Flávio Cappio, OFM – Bispo Diocesano de Barra – BA
(cpt)

 

*Fonte: Edenevaldo Alves