Discussões sobre construção de barragem de rejeitos continuam em região baiana

Barragem de rejeitos em Minas Gerais
27/05/2021 - 18:02

*Imagem ilustrativa*

Desde quando foi anunciada a construção de uma barragem de rejeitos na região de Caetité (BA), a população no entorno da área escolhida vem buscando diálogo com o empreendimento apontando nele pontos de preocupação, que vão desde a segurança da barragem até a localização escolhida para instalar a obra. Em 2017, uma recomendação do Ministério Público da Bahia indicava um dos pontos mais críticos do projeto: a construção da barragem estaria localizada na região das margens do Riacho Pedra de Ferro, responsável pelo abastecimento de diversas comunidades.

A obra, incluindo os três projetos da BAMIN – Mina Pedra de Ferro, Porto Sul e Trecho 1 da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), orçada em R$14 bilhões, é parte do Projeto Pedra de Ferro da Bahia Mineração que deve produzir e processar 18 milhões de toneladas de ferro anuais até os próximos cinco anos, especificamente os minérios hematita e itabirito, exportando esse material para fora do país por meio do Porto Sul, terminal que está em implantação e será operado pela BAMIN, em parceria com o Governo da Bahia. Com a extração desse material, a destinação dos rejeitos é alvo de muitos questionamentos por parte da população e do Ministério Público da Bahia.

O projeto inicial para armazenamento do rejeito previa a construção de uma barragem a montante que custaria R$ 90 milhões. Depois do rompimento das barragens do mesmo tipo do inicialmente previsto para construção pela Bamim, nas cidades mineiras de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), a empresa apresentou novos projetos, primeiro prevendo uma construção a jusante, com custo estimado em R$ 200 milhões e atualmente vem estudando a implementação de novo projeto com mecanismos de filtragem a seco. “O referido projeto foi debatido em audiências públicas e reuniões com as comunidades locais, sendo a licença de operação da mina renovada em dezembro de 2020. Atualmente, a Bamin já possui um projeto licenciado pelo Inema que prevê a construção de uma barragem de rejeitos a jusante com coeficiente de estabilidade e segurança de 2,24, bem acima dos índices exigidos pela legislação brasileira e práticas internacionais que é de 1,5. Este projeto de barragem a jusante será substituído pelo novo projeto de filtragem a seco, assim que for aprovado, que buscará garantir a máxima segurança. A Bamin vem estudando, nos últimos dois anos, a incorporação de um sistema de filtragem de rejeitos, que reduzirá a umidade do material, o que aumentará significativamente a recuperação de água, convertendo a barragem de rejeitos para uma unidade de pilha seca. A conclusão da engenharia básica será apresentada nos próximos meses ao Inema e à ANM para análise técnica. Além dos aspectos de segurança das instalações de filtragem de rejeitos, a recuperação de água acima de 90% reduzirá significativamente o uso do recurso natural. A operação atual está sendo executada em processo 100% a seco, sem utilização de barragem, conforme licença emitida”, afirmou, em nota, a empresa.

Bento Rodrigues e a barragem de Fundão, após seu rompimento

Embora a mudança do tipo de barragem tenha sido definida, há ainda outras questões. O local escolhido para a construção é na região do Riacho Pedra de Ferro que deságua na Barragem de Ceraíma, na cidade de Guanambi (BA), e segue para o Rio São Francisco. O riacho, de acordo com a comunidade, é o único afluente em que ainda corre água durante todo o período de estiagem, servindo para o abastecimento da população local, do distrito de Guirapá e do município de Pindaí, através das operações de carros-pipa. “No Pedra de ferro, segundo levantamento de uma organização local chamada IODA – Instituto Ver Pelos Olhos d´Água, são 28 nascentes vivas que fazem jorrar a única fonte de água que abastece as comunidades locais”, explicou Gilmar Ferreira dos Santos, agente pastoral da Comissão Pastoral da Terra (CPT) Sul Sudoeste da Bahia.

A CPT vem promovendo uma série de reuniões com as comunidades afetadas, incluindo a participação de órgãos públicos como a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Coordenadoria de Desenvolvimento Agrário (CDA), para discutir o direito ao acesso das comunidades ao território. “Todo esse processo se deu desde o ano de 2007, mas foi mais forte a partir do ano de 2009, quando a empresa deu início à materialização de suas intenções, até então pouco conhecidas e apresentadas nos espaços públicos. O projeto Pedra de Ferro foi apresentado no seu conjunto – mina, barragem de rejeitos, pilha de estéril, sistema de captação de água do Rio São Francisco com dutos que percorreriam mais de 200 km saindo do rio até a mina, sem uma demonstração clara onde seriam implantados ou por onde passariam. Só em 2013 as comunidades tomaram conhecimento da área que a empresa tinha definido para implantação, localizada em cima do leito do Riacho Pedra de Ferro”, acrescentou Santos.

De acordo com a CPT, o foco central das reuniões é a defesa das águas, das nascentes e das populações que vivem abaixo do empreendimento. “O ponto central vem sendo a água, uma vez que ao destruir as fontes, não existem outras alternativas para suprimento das populações que dependem tanto para o consumo, dessedentação animal e, muitas famílias, para a produção agrícola. Outro ponto de diálogo é a necessidade de a empresa repensar o projeto e buscar alternativas que gerem menos impactos ao meio ambiente e às famílias que dependem daquela água para sobrevivência”, pontuou.

 


Veja fotos do rompimento da barragem em Brumadinho


 

O Ministério Público da Bahia apontou, na recomendação à empresa, a não implantação da barragem de rejeitos na Área de Preservação Permanente (APP) do Riacho Pedra de Ferro. Segundo a promotora de Justiça Luciana Khoury, autora da recomendação, o documento indicava ainda que a empresa apresentasse alternativas locacionais e mantivesse intacta a vegetação nativa de toda a APP, além de promover a complementação dos Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA). “Atualmente existem três procedimentos em andamento no Ministério Público relacionados à Bamim tratando sobre a  supressão de cavernas, licenciamento ambiental e a barragem de rejeitos. A gente já sabe que a empresa está em operação com licenciamento para realizar a extração de minério para teste. No entanto, pensamos nos impactos dessa ação provocados na região de Pindaí, Caetité e Guanambi, uma área de vale onde existem comunidades tradicionais, principalmente a de fundo de pasto que utiliza a água do Riacho Pedra de Ferro. No projeto, esse riacho seria canalizado, provocando uma série de impactos socioambientais”, explicou a promotora, informando ainda que, quanto à recomendação feita pelo MP em 2017, a empresa não se manifestou e, do mesmo modo, também não assinou um Termo de Ajustamento de Conduta orientado pelo MP.

 

“Vale salientar que o início da exploração do minério, já está acarretando em impactos. Portanto, pedimos ao Inema que faça uma avaliação e nos informe a sua dimensão. Então, esta é uma questão urgente e como não houve acordo com a empresa, a gente precisa buscar as medidas cabíveis, ou seja, acionar o judiciário para adotar decisões sobre este caso”,
concluiu a Promotora.

 

Com as discussões acompanhadas pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, a preocupação também é evidente por parte do CBHSF. “Já participei de diversas reuniões, promovidas pela CPT, com as comunidades afetadas pelo empreendimento e temos presenciado a preocupação da população. As pessoas precisam ser ouvidas e respeitadas dentro deste processo que as atinge diretamente. Com as tragédias vivenciadas em Mariana e Brumadinho, não podemos ser negligentes com a vida das pessoas e desconsiderar a importância delas e de toda a biodiversidade envolvida em um empreendimento deste porte“, afirmou Almacks Luiz, membro da Câmara Técnica de Segurança de Barragens do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) e secretário da CCR Submédio São Francisco.

 


Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Juciana Cavalcante
Fotos: Léo Boi, Luiz Maia e Léo Rodrigues/Agência Brasil