Buscando a preservação dos aquíferos Urucuia e Cártisco, que contribuem significativamente para a manutenção da vazão do rio São Francisco, especialmente entre a divisa do estado de Minas Gerais e a montante de Sobradinho, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco contratou, através da Agência Peixe Vivo, estudo com foco na disponibilidade hídrica e nos diversos usos nas bacias dos rios Carinhanha, Corrente e Grande. O resultado foi apresentado na tarde da última sexta-feira (01) em Webinário realizado pelo CBHSF, com o objetivo de apresentar uma avaliação do conhecimento existente sobre a utilização das águas na área de influência dos aquíferos.
O Webinário, que teve a moderação feita pelo professor e membro da Câmara Técnica de Águas Subterrâneas (CTAS) do CBHSF, João Pedro da Silva Neto, foi aberto pelo presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, que destacou a importância do estudo para a compreensão da dinâmica da bacia do São Francisco. “O estudo é extremamente importante para o rio São Francisco porque traz um retrato da situação das águas subterrâneas, fundamental para a recarga da bacia, principalmente nos períodos de seca. Então, toda água retirada afeta o rio São Francisco, afeta em um contexto amplo e nós entendemos que é algo importante essa discussão, porque a água é uma só”.
O estudo, apresentado pelo Diretor da Profill Engenharia e Ambiente, Sidnei Agra, empresa responsável pela pesquisa, teve o objetivo de responder a questionamentos sobre a quantidade da vazão consuntiva em cada uma das bacias de interesse, a dimensão da área irrigada e a contribuição hídrica das bacias para o lago de Sobradinho, um dos maiores lagos artificiais do mundo, com 4.214 km² de área e 32,2 km³ de água. O trabalho foi acompanhado por membros do CBHSF, Diretoria Colegiada (DIREC), Câmaras Técnicas de Outorga e Cobrança (CTOC), e de Planos, Programas e Projetos (CTPPP), e teve a avaliação da Câmara Técnica de Águas Subterrâneas (CTAS). Com a conclusão do trabalho, cinco relatórios foram apresentados com a compilação dos principais resultados obtidos durante os onze meses de estudo, e propôs, ainda, recomendações relativas à possíveis continuidades em termos de pesquisa a serem contratadas pelo Comitê.
“Trata-se de um trabalho importante para fazer um raio X dos aquíferos, que têm papel fundamental para a bacia do São Francisco, por isso é importante acompanhar esse processo e verificar minuciosamente as análises feitas pelo estudo para que possamos conhecer sobre as águas subterrâneas e sua interligação com as águas superficiais e os cuidados que precisamos adotar para mantê-los vivos”, afirmou o professor e membro da Câmara Técnica de Águas Subterrâneas (CTAS), João Pedro da Silva Neto, lembrando que no próximo dia 14 de julho será realizada reunião com os membros da Câmara Técnica para dar continuidade às avaliações dos resultados obtidos pelo estudo.
De acordo com o documento, verificou-se que os usos destinados à irrigação constituem mais de 90% de toda água outorgada nas bacias, equivalente a 121,72 m³/s de volume total outorgado para essa finalidade. “O resultado obtido mostra que esse tipo de uso deve ser analisado atentamente em programas que visem o uso consciente e a correta gestão das águas nas bacias. O volume total outorgado para essa finalidade seria na ordem de grandeza de toda vazão média da bacia do Corrente, ou ainda metade da bacia do Grande. Isso indica que é muito provável que as outorgas não representem o volume real de água sendo efetivamente utilizada nas bacias e que, caso fosse de fato adotado, as consequências para a disponibilidade hídrica poderiam ser severas”, afirma o diretor da Profill Engenharia e Ambiente, Sidnei Agra.
Em seguida, vêm as retiradas voltadas à dessedentação animal, com 2,1% (1,196 m³/s), e abastecimento humano, com 1,6% das retiradas (0,937 m³/s). Neste caso, as projeções para o ano de 2035, mostram que pode haver um aumento de aproximadamente 50% nas demandas da irrigação, o que também leva o consumo total a aumentar na ordem de 50%. Já para o ano de 2050, a previsão é elevar para 65% o consumo da irrigação nas bacias do Grande e Corrente, e de mais de 156% na bacia do rio Carinhanha, concentrado principalmente nas sub-bacias Alto Carinhanha, Itaguari e Do Meio. O estudo indica que, nesse cenário, as demandas no Grande superariam em aproximadamente 17,6 m³/s as vazões outorgadas atualmente. Nas projeções para 2050, o consumo total subterrâneo projetado é de 26,201 m³/s, valor que se aproxima do dobro das captações atuais. Desse total, 63% seriam utilizados exclusivamente para irrigação, porcentagem essa que aumenta para 89%, se considerados o consumo humano, irrigação e uso não definido.
Em relação às demandas superficiais, a projeção mostra que especialmente as cabeceiras da bacia do rio Grande poderiam ser muito afetadas pela expansão das captações voltadas para a irrigação. Isso porque as demandas superam as outorgas existentes atualmente, o que pode levar a uma alta concentração em uma mesma região, a sub-bacia dos rios Branco e De Ondas e sub-bacia Alto Grande. “Contudo, ressalta-se que é provável que não se alcancem as projeções máximas, pois nessas regiões a outorga de uso da água já está próxima ao limite máximo permitido em alguns rios, o que limitaria a expansão do uso nessas localidades”.
Influência sobre a UHE Sobradinho
O estudo indica que é possível ver claramente a redução das vazões de base nos três principais rios, que contribuem para a manutenção do volume da UHE Sobradinho através do rio São Francisco. “Parece estar ocorrendo uma diminuição da disponibilidade nas bacias dos rios Grande, Corrente e Carinhanha em relação às últimas décadas. Essa diminuição das vazões dos rios associada às projeções das demandas apresentadas indica que as vazões outorgáveis no futuro poderão necessitar ser revistas, a fim de garantir o consumo otimizado e sustentável das águas nas bacias. Como a irrigação é a grande responsável pelo consumo de água na região, políticas de gestão voltadas aos irrigantes podem ajudar a garantir um futuro hidricamente mais seguro, caso a tendência de redução das vazões naturais permaneçam”, pontuou Agra.
Além disso, pesa também o fator da redução das chuvas, como sendo um dos principais condicionadores para a redução da vazão média. Com isso, a redução da precipitação e dos volumes dos rios deve servir de alerta para a gestão dos recursos hídricos. O documento ainda aponta que as “importantes iniciativas do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco devem potencializar resultados de conservação e preservação das águas em toda a área do Aquífero Urucuia, no entanto, são indutoras e não finalísticas”, ou seja, as ações do CBHSF podem ser potencializadoras, mas não terão condições de atingir os substanciais investimentos que precisam ser realizados em revitalização de bacias hidrográficas, que visa o aumento na quantidade e qualidade das águas da Bacia do Rio São Francisco.
Para preservar o aquífero que contribui significativamente para a manutenção das vazões do rio São Francisco, especialmente entre a divisa do estado de Minas Gerais e a montante de Sobradinho, o estudo recomenda ações de sustentabilidade, como aplicar o princípio da precaução em todas as áreas de recarga do Sistema Aquífero Urucuia. Além disso, define recomendações sobre os impactos da retirada de água das bacias, escassez hídrica, implicações sobre as vazões de Sobradinho e apontamentos de questões a serem melhor elucidadas; Gestão dos Recursos Hídricos; Monitoramento da água superficial e subterrânea; Regulação e fiscalização; Debate e publicização acerca da conservação do Aquífero e Ações executivas de conservação e recuperação.
Bacias de influência no estudo
A Bacia Hidrográfica do Rio Grande, situada ao norte, tem área de drenagem de cerca de 76,6 mil km², configurando-se na maior das três bacias, com uma população de 335,5 mil pessoas. O rio Grande situa se na região com maior número de áreas plantadas, com importantes afluentes como o rio das Fêmeas, de Ondas, rio de Janeiro e rio Preto. Essa bacia tem um importante papel tanto nos projetos de irrigação, como no abastecimento de vilarejos e cidades.
A Bacia Hidrográfica do Rio Corrente possui tamanho intermediário, de cerca de 34,8 mil km², e abrange 200 mil pessoas. O rio Corrente domina a drenagem com importantes afluentes, como os rios Formoso, Arrojado, Correntina, Santo Antônio, do Meio e Guará. Na região dos rios Pratudão e Pratudinho – afluentes do rio Formoso – algumas lagoas se formam pelo afloramento do nível d’água mais raso do Sistema Aquífero Urucuia (SAU), compondo a paisagem do Refúgio de Vida Silvestre das Veredas do Oeste Baiano, uma importante Unidade de Conservação. Os afluentes do rio Corrente são essenciais por serem a principal fonte de abastecimento de comunidades tradicionais do oeste baiano.
Já a Bacia Hidrográfica do Rio Carinhanha possui 7,8 mil km², uma população de 89 mil pessoas na Bahia, e 10 mil km² com cerca de 95,5 mil pessoas em Minas Gerais. O rio Carinhanha se situa no limite sul da área de abrangência do Aquífero Urucuia, e é um rio de domínio da União, servindo como a divisa entre os estados baiano e mineiro. Sua região de nascentes está dentro dos limites do Parque Nacional Grande Sertão Veredas. A área de estudo possui 39 municípios e, segundo o IBGE (2010), cerca de 923 mil pessoas habitam a região, das quais 397 mil correspondem a população rural, e 526 mil, urbana.
O estudo está disponível na plataforma do Siga São Francisco no SIGA São Francisco.
Confira o Webinário na íntegra, no cala do CBHSF, no Youtube:
Assessoria de Comunicação do CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Juciana Cavalcante
*Fotos: TantoExpresso; Juciana Cavalcante