Revista Chico nº 7: Da boa

13/08/2020 - 16:28

O Rio São Francisco é brasileiro, da nascente à foz. A cachaça também só existe aqui. Quando se cruzam, o resultado não deixa a desejar a nenhum uísque escocês. A seguir, você vai conhecer quatro histórias de branquinhas que, nascidas sob a influência da cultura ribeirinha, se destacam, conquistando paladares cada vez mais refinados e status de bebida importante.


Em Januária

Corriam os anos 30 na mineira Januária, localizada no médio São Francisco, quando o comerciante Astério Itabayana começou a produzir e vender a sua cachaça. Para chamar a atenção dos viajantes que por ali passavam aos montes, subindo e descendo o Velho Chico, então uma importante rota comercial do país, batizou-a com um nome sedutor: Insinuante. Ao longo das décadas, a caninha de seu Astério fez fama no concorrido mercado local. Como se sabe, Minas Gerais é lugar de cachaça boa. E Januária, famosa pelos antigos alambiques que povoam seus arredores.

Em 1996, a Insinuante foi comprada por Marcelo Ricaldoni Alves e, a partir de então, começou a correr mundo. Hoje é uma das dez cachaças artesanais mais vendidas do Brasil. São envasados mensalmente cerca de mil litros, aproximadamente 1600 garrafas. Segundo Gabriel Ricaldoni, segunda geração da família à frente do negócio, o segredo é uma soma de fatores: “conseguimos juntar o doce da cana pura, o paladar encorpado dos seus 48% de graduação alcoólica e o gostoso cheiro suave da amburana”.

Para Gabriel, que cuida do marketing da Insinuante, o nome remete ao espírito dos nativos de Januária, povo “simpático e sedutor”. Já o rótulo, nas cores vermelho e amarelo, foi inspirado no deslumbrante pôr do sol às margens do São Francisco.

Na Serra da Canastra

A cachaça Nascente do Velho Chico, fabricada na Serra da Canastra, não é qualquer cachaça. Cachaça gourmet, como se diz por aí, fabricada em tons e nuances diferentes, para paladares distintos. A tradicional possui sabor delicado, levemente frutado e aroma característico da cana. O produto mais nobre é a versão envelhecida por cinco anos em tonéis de carvalho. Ao todo, são produzidas, mensalmente, cerca de 1000 garrafas da Nascente do Velho Chico, que chegam a 21 estados do Brasil.

Até começar a espalhar a sua cachaça pelo país, o produtor Francisco de Oliveira só fazia – e vendia – queijo. Aliás, como muita gente na Serra da Canastra, região que virou sinônimo de queijo artesanal de qualidade. O chamado queijo Canastra é fabricado há pelo menos dois séculos, primo do queijo de São Jorge, fabricado na ilha dos Açores. Segundo Francisco, ao comercializar a sua produção, ele logo percebeu que os clientes que compravam queijo também queriam uma boa cachacinha para fazer par. Da dobradinha infalível, nasceu a Nascente do Velho Chico.

O nome escolhido para o batismo da aguardente não podia ser outro. Além de terra do queijo, a Serra da Canastra também abriga a nascente do Rio São Francisco. O rótulo remete à cachoeira Casca D’anta,  primeira queda d’água do Velho Chico.  “Buscamos mostrar o que nós acreditamos ser uma das maiores belezas de toda extensão do rio”, comentou Francisco. De acordo com ele, a água utilizada na produção da cachaça e na higienização das garrafas chega pelo afluente Ribeirão das Araras.

Cachaça é o nome de batismo e pinga o apelido de infância. A queridinha dos brasileiros é também conhecida como aguardente, branquinha, engasga-gato, manguaça, abrideira, malvada, cana, caninha, calibrina, braseira, abençoada, arrepia-cabelo, beijo-de-copo, dá-coragem, entre outros.

Em Paramirim

Em 1996, o casal Adeylsa e Edvaldo Antônio de Souza Matos começou a fabricar a cachaça Paramirim, que leva o nome da cidade baiana onde nasceu. O pai de Edvaldo já tinha feito história no ramo da produção de aguardente quando, em 1956, acompanhou o cunhado, descendente de turcos, numa empreitada arrojada para a época: implantar um alambique moderno no meio do sertão. Segundo contou Edvaldo, o gosto pelo ofício, sem dúvida, é herança paterna.

“A gente atribui o sabor da nossa cachaça ao tipo de solo que temos aqui no vale do Rio Paramirim. A cachaça Paramirim é adocicada, lembra muito fruta madura”, comentou ele. Um dos principais afluentes do Rio São Francisco, o Paramirim irriga justamente plantações de cana de açúcar. “A barragem do Zabumbão é a salvação da região. O São Francisco é fundamental nas nossas vidas”, salientou o produtor.

A montanha e os contornos que marcam a paisagem estampam o rótulo da bebida, premiada no ano de 2019 em uma importante feira do setor, em Minas Gerais.  Atualmente, são produzidos cerca de 25 mil litros da cachaça por ano.

Entre Morro do Chapéu e América Dourada

Em uma fazenda plantada entre Morro do Chapéu e América Dourada, dois municípios do sertão baiano, a cachaça ganhou o sotaque da Caatinga. O casal Matteus da Silva Bagano e Indira Ferreira inventou a UmbuGarapa, uma aguardente com o toque mágico do fruto do Umbuzeiro, árvore típica da região. A fazenda fica perto do Rio Jacaré, afluente do São Francisco. “Utilizamos a água do rio para esterilizar o material e o fruto, além de lavar o que vamos usar. Deixamos tudo esterilizado para começar o processo de infusão da cachaça”, explicou Indira.

Atualmente, a produção gira em torno de 100 garrafas por mês. A expectativa é dobrar a produção em 2021.  Além da cachaça, o casal produz o licor, o doce e a geleia de Umbu. “A cachaça surgiu da necessidade de aproveitamento do umbu produzido a cada ano na fazenda. Fizemos os primeiros testes da produção em família e hoje o processo continua totalmente familiar. Realizamos todas as etapas, desde a catação do fruto na época, produção, rotulagem e distribuição”, relatou a produtora.

Criada em 2018, a UmbuGarapa tem gosto, cheiro e cor do umbu, graças ao uso do método de infusão. O rótulo também não deixa dúvida da terra natal, inspirado na xilogravura, uma arte da poesia de cordel. Na imagem, traços da bela e inconfundível paisagem sertaneja.

 

Cachaça UmbuGarapa

Outros rótulos: Cachaça Triumpho Produzida na cidade serrana de Triunfo, localizada na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, no Sertão do Pajeú, em Pernambuco, conhecida como a Capital da Rapadura! Foi a 1° Cachaça do Brasil a receber a Certificação de Conformidade do INMETRO. Gogó de Ema Medalha de Ouro no Concurso Mundial de Bruxelas de 2018, é produzida no município alagoano de São Sebastião, que está inserido na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e é banhado pela sub-bacia do Rio Piauí, cujo principal afluente é o Riacho do Meio. Cachaça Claudionor Pioneira na produção artesanal na cidade de Januária, no Médio São Francisco, em Minas Gerais, desde 1925. É um dos rótulos mais conhecidos do Brasil. Cachaça Xingó Produzida em Laranjeiras, Sergipe, a cachaça Xingó homenageia a hidrelétrica construída sobre o Rio São Francisco, entre Alagoas e Sergipe.

 

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Andréia Vitório
Fotos: Divulgação