MPF quer impedir atividades em área da UHE Formoso para evitar contaminação de comunidades tradicionais por Covid-19

14/05/2021 - 9:29

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação civil pública contra as empresas Formoso Energia e Quebec Engenharia, para que impedir a realização de atividades de campo na área de impacto do projeto da Usina Hidrelétrica de Formoso, com construção prevista no leito do Rio São Francisco, em Pirapora (MG), na região do Alto São Francisco. Nessa região, vivem os indígenas Tuxá, as comunidades quilombolas João Martins e Tira Barro, além de pescadores artesanais, ribeirinhos, vazanteiros, barranqueiros e remeiros, que são povos tradicionais mineiros que ocupam território nas margens do Velho Chico.

De acordo com o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Helder Magno da Silva, responsável pela ação civil pública, as atividades de campo realizadas pelos empreendedores podem resultar na contaminação das comunidades tradicionais, acarretando um colapso entre eles, bem como a sobrecarga da rede assistencial de saúde pública, com possível insuficiência dos leitos clínicos e de terapia intensiva atualmente existentes. “Os povos tradicionais são vulneráveis ao novo vírus e temos que protegê-los. A Lei 14.021, de 7 de julho de 2020, criou medidas de vigilância sanitária e epidemiológica para prevenção do contágio e da disseminação do Covid-19 nos territórios indígenas e estipulou medidas de apoio às comunidades quilombolas, aos pescadores artesanais e aos demais povos e comunidades tradicionais. Além disso, estabeleceu a restrição de acesso de pessoas estranhas às comunidades, como forma de impedir a disseminação e circulação do vírus entre eles”, disse.


Veja as fotos do local previsto para a construção do empreendimento:


No entanto, denúncias alertam que, desde meados de outubro de 2020, trabalhadores das empresas Quebec Engenharia S/A, Tractebel Suez e SPE Formoso estão realizando trabalhos de campo nas cidades de Pirapora, Buritizeiro, Várzea da Palma e Lassance, mesmo diante do agravamento da pandemia. “Apesar das restrições decretadas pelo governo estadual e prefeituras municipais na região de implantação da UHE Formoso ao longo dos últimos meses, durante as quais apenas serviços essenciais estavam autorizados a funcionar, os empreendedores mantiveram suas atividades em campo, em desobediência não apenas aos decretos governamentais, como à própria Lei 14.021”, explicou o procurador.

Helder Magno da Silva esclarece ainda que também são réus na ação a União, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). “O objetivo é obrigá-los a fiscalizar as atividades de licenciamento ambiental ou estudos preliminares do empreendimento que estejam sendo realizados em desconformidade com as normas sanitárias da pandemia da Covid-19 e impliquem em contato ou interação social com povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais, especialmente nos municípios de Buritizeiro, Pirapora, Lassance, Várzea da Palma, São Gonçalo do Abaeté e Três Marias”, afirmou.

O coordenador da Câmara Consultiva Regional (CCR) Alto São Francisco, pertencente ao Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), Altino Rodrigues Neto, ressalta que a UHE Formoso ameaça apagar a identidade de diversas comunidades tradicionais, além de outros impactos. “A barragem impactará diretamente uma área protegida de altíssimo valor biológico e relevância para a conservação de peixes. Também afetará as comunidades tradicionais dependentes dos rios com uma redução inevitável dos serviços ecossistêmicos, resultando em perdas econômicas substanciais para a região. Portanto, a construção dessa usina hidrelétrica apresenta um alto risco para a biodiversidade, assim como para as pessoas que dependem desse rio. Gente em harmonia com o meio em que vivem. Somos parte do todo, sem explorar tudo!”, destacou.

O que dizem as comunidades tradicionais 

Os indígenas Tuxá estão há 65 anos na região de Pirapora, próximo à confluência do rio Paracatu com o Rio São Francisco, região que será inundada pela construção da UHE Formoso.

A cacique Anália Tuxá, da aldeia de Buritizeiro, e seu povo, são contra a construção do empreendimento na região. “Temos fé que a UHE Formoso não será construída na região de Pirapora, afetando o nosso território. Nossa aldeia se encontra fechada para visitantes por causa da pandemia e mesmo que as empresas queiram não vão entrar para realizar trabalho de campo”, disse.

O pescador de Pirapora Josemar também é contra a UHE Formoso. “Esse povo não para! Mesmo com a pandemia, continuam realizando atividades de campo aqui na região. Nós que somos contra paramos os trabalhos de mobilização contra a UHE Formoso de forma presencial e estamos fazendo contato por telefone, com pessoas conhecidas. É uma vergonha! Existe a falsa ideia de que a UHE Formoso trará desenvolvimento para a região, por meio da geração de empregos e de incremento na economia. Isso é mentira e estamos esclarecendo isso para a população local”, expôs.

A quilombola Sandra Maria da Silva Andrade, representante das comunidades tradicionais no CBHSF, afirma que o empreendimento preocupa os ribeirinhos e a sociedade civil em geral, pela falta de transparência e pelos seus incontáveis impactos. “A usina coloca em risco a sobrevivência de inúmeras comunidades tradicionais que vivem não só na região, mas em toda a bacia, como povos indígenas, comunidades quilombolas, pescadoras, vazanteiras e pequenos agricultores. Estamos mobilizando toda a sociedade para lutar contra este projeto que, mesmo com a pandemia não parou por um segundo sequer”.

 

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio
*Fotos: Léo Boi, Leonardo Ramos e Miguel Aun