Décima edição da campanha Vire Carranca, em Paratinga (BA), mobiliza população no Médio São Francisco

06/06/2023 - 13:35

Ao chegar a sua décima edição, a campanha “Eu viro carranca para defender o Velho Chico”, do CBHSF, se consolida entre os principais eventos da área ambiental na bacia hidrográfica do rio São Francisco. Com o mote “Velho Chico: gentes, tradições, vidas”, os patrimônios cultural e natural dos povos tradicionais da bacia, como quilombolas, indígenas, pescadores artesanais e povos de terreiros, estiveram no centro das ações do dia 3 de junho. O município de Paratinga, no oeste baiano, sediou as atividades no Médio São Francisco, que reuniram centenas de pessoas.


A cerimônia de abertura recepcionou os participantes na Casa do Saber, no centro da cidade, com representantes do Quilombo Lagoa do Jacaré, Quilombo Pau D’arco e Parateca, Quilombo Lagoa das Piranhas, CBH Paramirim e Santo Onofre, CBH do Rio Corrente, CBH Grande, Fundifran, Consórcio Intermunicipal do Oeste da Bahia (CONSID), Prefeitura Municipal de Paratinga, Câmara Municipal de Paratinga e Codevasf. Integrantes do poder público municipal, estudantes de escolas e universidades e moradores de diversos municípios do Médio SF também compareceram.

Música, dança e teatro

Com muita ludicidade, os primeiros momentos do dia 3 de junho foram marcados por música, dança e teatro. A Sociedade Filarmônica 13 de Junho, organização paratinguense centenária, apresentou músicas populares brasileiras. O compositor natural de Paratinga, João Pereira, também entoou canções que homenageiam o rio São Francisco e alertam para os graves problemas ambientais que o rio enfrenta. A programação musical da manhã contou, ainda, com apresentação do Reisado de Pedra Comprida.

Alunos da pré escola municipal Prof. Dulce e das creches dos bairros Cruzeiro e Tomba encenaram a origem do rio São Francisco conforme a cosmologia indígena. O palco também esteve aberto para convidados se apresentarem. Foram diversas expressões de uma cultura assentada no aporte das manifestações indígenas, quilombolas, portuguesas e de boiadeiros e tropeiros que cruzavam as paragens ribeirinhas, reafirmando trilhas e lugares de pouso, como aconteceu com a própria Paratinga no século 18.

O prefeito Marcel Carneiro destacou as parcerias estabelecidas entre o município de Paratinga e o CBHSF. “Nós realizamos, através do CBHSF, o Plano Municipal de Saneamento Básico, que está possibilitando a captação de recursos federais para obras de saneamento no município. Este ano temos a alegria de sediar essa importante campanha de mobilização em defesa do rio. Isso demonstra que o CBHSF está pautando a agenda ambiental na bacia e fazendo contribuições importantes para a melhoria das nossas águas”, avaliou Carneiro.

O coordenador da CCR Médio São Francisco, Ednaldo Campos, ressaltou a participação das creches, escolas e universidades. “A educação ambiental nos espaços de aprendizagem é de importância estratégica, a campanha Vire Carranca busca mobilizar com atenção esse setor, produzindo materiais para serem trabalhados nas escolas e divulgando pesquisas científicas realizadas nas universidades”, disse Campos. No cais de Paratinga, foram instalados totens educativos para visitação da população, com informações ilustradas sobre a bacia do rio São Francisco, dentre as quais fauna, flora, múltiplos usos da água e aspectos culturais.

Os alunos do Polo Educacional Gileno do Vale Xavier, zona rural do município, participaram da programação como parte das atividades do sábado letivo. A vice diretora da instituição, Leonir Campos Araújo, elogiou a iniciativa, que abre a programação da Semana do Meio Ambiente na escola. “O Vire Carranca é uma campanha que vai ao encontro do que é uma educação contextualizada, que valoriza o espaço geográfico, a cultura e a identidade do lugar, incentivando um olhar fora dos estereótipos sobre o semiárido”. Hugo Sá Teles, estudante do 1º ano do Ensino Médio, afirma ter orgulho de ser ribeirinho e se diz ciente das ameaças à sobrevivência do rio São Francisco. “Através do que os mais velhos contam, é possível saber que a vazão do rio diminuiu muito e que o acúmulo de areia e lixo é um problema sério”, analisa Hugo.


Confira mais fotos do dia de atividades em Paratinga (BA): 


Palestras temáticas

Reforçando o compromisso com a troca de conhecimentos e com a valorização dos saberes ambientais ribeirinhos, foram realizadas palestras temáticas sobre Educação Ambiental – ministradas pela coordenadora do Projeto Vozes, Berê Brasil – e sobre Políticas públicas de sustentabilidade para os Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs), com a quilombola mestre em Desenvolvimento Sustentável, Valéria Pôrto.

“O rio São Francisco é um condutor de vidas e os povos são fruto do seu processo de formação. Por isso, o mote da campanha Vire Carranca se desdobra em ‘cuidar dos povos para preservar o rio, preservar o rio para cuidar dos povos’”, disse Valéria, que também se posicionou contrária ao Marco Temporal para terras indígenas aprovado na Câmara dos Deputados, em Brasília. “O reconhecimento e a garantia dos nossos territórios ancestrais são a base para qualquer política pública para os PCTs”, afirmou Valéria.

Berê Brasil relatou as experiências do CONSID e do Projeto Vozes, sensibilizando a plateia para a multiplicidade de experiências, valores e ideias presentes na educação ambiental. “O agricultor, o pecuarista, o povo de santo, o pesquisador, cada um traz o seu olhar sobre o rio e contribui ao seu modo para a riqueza cultural e os ecossistemas peculiares da bacia do São Francisco”, declarou Berê. A técnica do CONSID apresentou que os principais desafios apontados pelos municípios são implantar educação ambiental como política pública abrangente, realizar capacitação permanente e possuir quadro de servidores específicos, conforme dados de pesquisa recente realizada pelo Ministério Público e Secretaria Estadual de Meio Ambiente da Bahia.

Caminhada até o cais e visitação aos stands

Após a programação na Casa do Saber, os participantes saíram em caminhada até o cais de Paratinga, munidos de máscaras coloridas de carranca e panfletos informativos. Uma comitiva com o governador do estado, prefeitos, senadores, deputados e representantes do CBHSF acompanhou o movimento e materiais da campanha Vire Carranca foram entregues ao governador.

No centro do cais do porto, uma carranca em madeira talhada com aproximadamente 3 metros de altura aguardava os visitantes. A obra é do artista natural de Juazeiro e reconhecido como cidadão de Paratinga, Eduardo Sá. O artista é responsável pela restauração de diversos casarões no município e tem várias esculturas espalhadas pela cidade. Hoje vendida em mercados e feiras populares, as carrancas são símbolo de proteção e os artesãos responsáveis pelas peças são chamados de carranqueiros.

Ao longo de uma das principais avenidas da cidade, stands das associações remanescentes quilombolas, colônia de pescadores, ADAB, Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB), Codevasf e secretarias municipais realizaram ações, dentre as quais doações de mudas nativas e venda de produtos da agricultura familiar. No stand da UFOB, estudantes de graduação dos cursos de Biotecnologia e Engenharia de Produção demonstraram projetos de pesquisa em práticas sustentáveis com foco nos recursos hídricos.

Francisca Fernanda, estudante de Biotecnologia, apresentou o projeto que está desenvolvendo com microalgas coletadas nos leitos dos rios do cerrado – entre os quais o rio Grande e o rio Corrente – e que busca medir o potencial biotecnológico desses microrganismos na produção de fertilizantes. O curso possui, ainda, projetos de preservação das sementes de plantas do cerrado e pesquisas sobre fungos que tornam possível produzir álcool a partir do resíduo da cana de açúcar, reduzindo o consumo de água.

O encerramento do evento contou com apresentações musicais de convidados de várias cidades da bacia, que prestaram suas homenagens ao Dia Nacional em Defesa do Rio São Francisco. Com um repertório composto por canções que defendem a preservação cultural e ecológica do rio São Francisco e do sertão, sonoridades que misturaram do sertanejo raiz até o rock’n’roll se uniram para virar carranca.


Assessoria de Comunicação do CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Mariana Carvalho
*Fotos: Kel Dourado