“Não à construção da UHE Formoso!” A frase foi dita pelo pescador da região de Pirapora, Josemar Alves Durães, durante o seminário online sobre a Usina Hidrelétrica (UHE) Formoso, realizado no dia 28 de outubro. Este foi o segundo seminário da série promovida pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) que segue nos próximos meses e irá debater a proposta de implementação da usina, abordando questões sociais, econômicas, culturais e seus impactos.
A necessidade de transparência do processo para as pessoas diretamente impactadas pela usina foi destacada pelo presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda. “Não dá mais para construir barragem no Rio São Francisco. Fomos pegos de surpresa e queremos participar efetivamente do debate. O CBHSF contratou um estudo para ter dados sobre os impactos e será um grande instrumento para auxiliar nas discussões”.
Foto de arquivo. Crédito: Ohana Padilha
O presidente do CBHSF destacou a importância da construção do Pacto das Águas. “A ideia do Pacto é transformar a gestão das águas do Rio São Francisco em uma política de estado e não uma política fragmentada de governos. Os estados de Alagoas, Pernambuco, Sergipe, Minas Gerais e Bahia precisam interagir junto com o governo federal para fazer a recarga de aquíferos, recomposição de matas ciliares e florestal, lutar contra o assoreamento dos rios, impedir que os biomas da Caatinga e do Cerrado sejam destruídos, além de regulamentar a gestão dos recursos hídricos quanto a quantidade e a qualidade das águas”, explicou.
Participaram do debate a professora de arqueologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Maria Jacqueline Rodet; a professora e pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Investigação Socioambiental (NIISA) da Unimontes, Ana Paula GlinfskoiThé, o pescador Josemar Alves Durães, o representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Moisés Borges, e a promotora de Justiça do Estado da Bahia, Luciana Khoury.
Impactos para as comunidades
A segunda edição do Seminário UHE Formoso teve como foco os impactos sobre as comunidades. A professora de arqueologia da UFMG, Maria Jacqueline Rodet, mostrou as pesquisas arqueológicos realizadas na região do projeto da UHE Formoso e a importância de preservar o passado barranqueiro. “As pesquisas históricas na região nos mostram que a relação dos povos com o rio datam de 11 mil anos atrás. O local tem uma relação intrínseca com o rio, desde o passado as pessoas vivem ali por conta da pesca, além da região ser um sítio arqueológico riquíssimo”, esclareceu a professora, que disse ainda que na área de impacto declarada pela empresa existem mais de 60 sítios arqueológicos registrados.
Ana Paula GlinfskoiThé, da Unimontes, mostrou que os modos de vida das comunidades pesqueiras, vazanteiras, quilombolas e indígenas do Velho Chico estão ameaçados pela UHE Formoso. “Os impactos serão tanto para as comunidades a montante quanto a jusante do empreendimento. A bacia vive uma crise em função da baixa vazão do rio, que afeta todas as regiões, na qual as vazões ecológicas das nove barragens/hidrelétricas que já existem tiveram seus limites alterados para baixo. Não há água suficiente nem mesmo para produzir a energia projetada nas hidrelétricas localizadas na região do Submédio e Baixo São Francisco. A construção da UHE Formoso coloca em risco a sobrevivência de inúmeras comunidades tradicionais que vivem não só na região, mas em toda a bacia, como povos indígenas, comunidades quilombolas, pescadoras, vazanteiras e pequenos agricultores”.
Os povos que vivem e fazem viver o Velho Chico têm muita clareza de que a construção da hidrelétrica impactará de forma negativa. “Se a UHE Formoso for construída vai matar de vez o nosso Rio, matando junto nossa tradição, nossa cultura, matando assim a vida de um povo que o Rio São Francisco abraça e cuida há muitas gerações”, lamenta.
Moisés Borges, do MAB, mostrou que existe uma falsa impressão de que o empreendimento da UHE Formoso trará desenvolvimento para a região, por meio da geração de empregos e de incremento na economia. “O projeto é insustentável do ponto de vista econômico, social e ambiental, e também incapaz de beneficiar a comunidade local como vem sendo idealizado por alguns interlocutores. Esse tipo de obra traz a migração sazonal de trabalhadores ocasionando o aumento da violência e exploração sexual, pressão sobre os serviços públicos, elevação do custo de vida e outros estorvos. Assim, bons salários para os sócios e mão de obra especializada. Para a população, problemas sócio-ambientais e empobrecimento”.
Ele afirmou também que não existe demanda energética no Brasil. “Somadas todas as fontes de energia, o Brasil tem capacidade de 93 mil megawatts médios, ao passo que o consumo em nosso país é de 65 mil megawatts. O Brasil tem uma sobra de energia de 30%”.
A promotora de Justiça do Estado da Bahia, Luciana Khoury, finalizou o debate perguntando: “Qual é a finalidade da UHE Formoso? Sabemos que não é para a geração de energia e nem para regular vazão. Precisamos nos atentar para o Plano de Bacia do Rio São Francisco que é um dos instrumentos de gestão da bacia e que não prevê a construção desse empreendimento. É importante que se faça uma discussão sobre os impactos cumulativos da UHE Formoso: sociais, econômicos e principalmente sobre os recursos hídricos”.
Assista ao seminário que foi transmitido pelo canal do CBHSF no Youtube:
UHE Formoso
Em maio deste ano, um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, que enquadra a UHE Formoso no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), surpreendeu comunidades e ambientalistas pela falta de transparência em sua tramitação. Empreendimentos qualificados ao PPI são tratados como prioridade nacional, o que agiliza processos necessários.
A UHE Formoso, com potência instalada de 306 MW, está projetada para ser implantada no Rio São Francisco, no estado de Minas Gerais, a 12 km da cidade de Pirapora (MG) e a 88 km da UHE Três Marias. A área de reservatório apresenta tamanho de 312 km2. A área do empreendimento abrangeria os municípios de Pirapora, Buritizeiro, Lassance, Várzea da Palma, Três Marias e São Gonçalo do Abaeté.
Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio