Cidades do Alto São Francisco se assustam com grande volume de moluscos mortos no Rio São Francisco

04/11/2021 - 12:46

Nas últimas semanas a superfície da bacia hidrográfica do Rio São Francisco na região do Alto São Francisco tem sido tomada por moluscos mortos que geralmente vivem em colônias no fundo do rio. Os primeiros registros aconteceram nas cidades de Matias Cardoso e Manga, em Minas Gerais, mas outras localidades também já foram afetadas, como é o caso de Ibiaí, Januária, Itacarambi (MG), além de Malhada e Carinhanha (BA).

Moradores destas cidades afirmam que o fenômeno acontece há pelo menos cinco anos, porém em menor proporção. Diferente do que aconteceu nos últimos anos, onde a ocorrência foi pouca, este ano se formou um verdadeiro tapete de moluscos mortos em algumas destas localidades. Como efeito, o mau cheiro, a impossibilidade até mesmo de consumo humano das águas em algumas comunidades rurais, e da pesca, já que alguns peixes se alimentam desta espécie e tornam-se impróprios para o consumo. O Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP Nacional), pastoral social ligada à Comissão Episcopal Pastoral está acompanhando as regiões afetadas e, de acordo com a educadora social da CPP, Laís Cristina Rodrigues, a mortandade de moluscos em grande quantidade está assustando e preocupando os pescadores e pescadoras. “Além do rio também estar com mau cheiro, desde o dia 13 de outubro soubemos que os moluscos desceram passando por Ibiaí. Há relatos de peixes mortos em Itacarambi. Alguns peixes estão com os moluscos no estômago. Segundo os pescadores esse é um alimento para a espécie curimatá. Até o momento nenhum órgão ou entidade se manifestou sobre o assunto”, explicou.



A mesma situação também ocorreu em comunidades ribeirinhas de vazanteiros e pescadores das cidades mineiras de Buritizeiro, São Romão, São Francisco e Pedras de Maria da Cruz. Os prejuízos são ainda maiores para as comunidades que não têm acesso a água potável, como relata Marinalva Mendes da Rocha, moradora da comunidade quilombola de Cabaceiras, no município de Itacarambi. “ Essa não é a primeira vez que essas ‘lesminhas’, como a gente chama, aparecem. Já tem cinco anos que eles aparecem, mas nunca foi tão intenso, igual aconteceu agora. A água não dá para usar e pelo menos na nossa cidade não apareceu ninguém para explicar o que está acontecendo”.
Em Matias Cardoso, diversos pescadores registraram a situação em vídeos pedindo auxílio das entidades competentes. “Primeiro a água ficou verde e com mau cheiro, depois o rio foi tomado por esses caramujos. Eles vêm desde a região do Rio das Velhas, onde todas as comunidades estão vivendo o mesmo problema e nós, que somos pescadores, a gente vive a dificuldade na pesca, por causa dessa situação”, explicou a pescadora Joana Lúcia da Costa, da comunidade Pau Preto, no município de Matias Cardoso.
Em Buritizeiro-MG, os moradores afirmam que o fenômeno também está acontecendo de forma surpreendente e fora do período habitual. Segundo o pescador artesanal e vazanteiro da comunidade tradicional pesqueira e vazanteira de Canabrava, Clarindo Pereira dos Santos, em menor proporção, a situação ocorria geralmente no mês de junho. “Sobre a mortalidade dos caramujos, popularmente conhecidos por nós como mariscos, está ocorrendo da Foz do Rio das Velhas até a Foz do Rio São Francisco. É um fenômeno que vem acontecendo já há alguns anos em menor quantidade e que não causava muito espanto, mas agora está de forma assustadora e fora de época. Esses animais aquáticos começam a aparecer mortos do mês de junho até no máximo setembro, e esse ano começou no mês de setembro com uma quantidade enorme de caramujos descendo e quando eles morrem, logo começam a feder provocando um cheiro muito forte. Até a presente data ainda não temos nenhuma explicação lógica desse acontecimento”.
Na cidade de Ibiaí (MG) pescadores precisaram interromper a atividade também. “Quando chega na época do calor, começam a aparecer na superfície esses caramujos, e um mau cheiro que é insuportável; até quem mora mais longe do rio, sente o odor. O prejuízo é certo, porque tem peixes que se alimentam desse caramujo e acaba deixando ele também com o cheiro de podridão. Nessa época, nem compensa pescar porque não tem comércio”, relatou Magno Seixas Moreira Silva, representante da colônia de pesca Z20, lembrando ainda que a situação tem se agravado ao longo dos anos. “Isso acontece há muito tempo, porém a cada ano que passa, parece que está ficando pior”.

Sem respostas para o problema que tem impactos nas cidades, a CPP promoveu no dia 03 uma reunião virtual com pesquisadores para tentar entender o que pode estar provocando a mortandade dos moluscos. De acordo com a bióloga, especialista em etnoecologia Ana Thé, o intuito é abrir espaço para dialogar sobre as possibilidades do que estaria causando o fenômeno. “A poluição é a maior possibilidade mesmo, mas temos que nos aprofundar sobre o assunto e ver que encaminhamentos tomar”.

Enquanto isso, em Januária-MG os moradores clamam por socorro. “A gente pede o apoio dos órgãos em defesa do Velho Chico para fazer com que o poder público olhe para o rio com mais carinho, mais amor, porque a gente sabe que o Rio São Francisco está morrendo. E até então, nada foi feito”, relatou Maria das Dores Pereira da Silva, pescadora e presidenta da comunidade quilombola, pesqueira e vazanteira de Croatá, município de Januária.

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, através da Câmara Consultiva Regional do Alto São Francisco, também vem acompanhando e buscando junto aos órgãos competentes mais informações. “Estamos em busca de informações com o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e com a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais para acompanhar o que está acontecendo nessa região”, concluiu o Secretário da CCR, Adson Ribeiro.

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Juciana Cavalcante