Prefeitura de Jeremoabo entregou escritura pública de doação do terreno
Durante a manhã da última segunda-feira (31) o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) e o Centro de Pesquisas em Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação (Opará) – Órgão Suplementar da Universidade do Estado da Bahia, assinaram o protocolo de intenções para instalação do campus avançado de formação e pesquisa para os povos indígenas, comunidades tradicionais e camponeses. Na ocasião, também foi realizada a entrega da escritura pública pela prefeitura de Jeremoabo-BA do local que sediará a nova estrutura.
Comemorando conquista e dando um passo importante para a garantia da formação de povos originários e comunidades tradicionais, a manhã da segunda-feira foi marcada por cânticos, danças, ritos e, principalmente, muita emoção. Isso porque, depois de intensos anos de luta e resistência o Opará, que funciona desde 2008 promovendo a qualificação de professores, pesquisadores, profissionais indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais, oferecendo cursos de formação continuada e pós – graduação intercultural, vai ganhar, através da parceria com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e da prefeitura de Jeremoabo, um campus avançado de formação e pesquisa para os povos indígenas, comunidades tradicionais e camponeses (Campus Avançado de Jeremoabo – OPARÁ UNEB).
O evento para a entrega da escritura pública de doação do imóvel pela prefeitura de Jeremoabo, através do prefeito Derisvaldo Santos e a assinatura do Protocolo de Intenções entre a UNEB e o CBHSF para a reforma e ampliação das instalações do espaço aconteceu no Centro Territorial de Educação Profissional – CETEP Semiárido Nordeste II, local onde a nova estrutura do Opará será erguida. “Este é um dia de gratidão por saber que teremos a Uneb em Jeremoabo, mãe de todas as cidades vizinhas. Estão todos de parabéns por pensar, valorizar e unir os povos tradicionais em um campus avançado de ensino que vai dar acesso digno à educação. Todos podem contar com nosso empenho, assim como foi no processo de doação do espaço, para viabilizar a valorização dos povos tradicionais”, afirmou o prefeito.
O Centro de Pesquisas em Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação (Opará), é um Órgão Suplementar da Universidade do Estado da Bahia, sediado no Departamento de Educação Campus VIII, em Paulo Afonso. A meta, com a nova estrutura, é atender ainda agricultores familiares e ribeirinhos das regiões norte, nordeste e oeste da Bahia. Com mais de 500 estudantes, entre a licenciatura Intercultural em Educação Escolar Indígena (LICEEI e Pedagogia Indígena), especialização e mestrado nas áreas afins, o Opará tem a previsão de abertura de pelo menos mais 100 vagas. Com mais de 80 pesquisadores envolvidos, o Centro, que também funciona com núcleos nos Campi de Euclides da Cunha e Juazeiro, deverá se tornar um campus universitário avançado, desenvolvendo atividades de pesquisa, extensão e ensino superior na modalidade de pedagogia da alternância junto aos povos indígenas, camponeses, povos e comunidades tradicionais nos territórios que compõem o Submédio São Francisco.
A reitora da universidade, Adriana Marmori Lima, lembrou a luta dos pesquisadores e da instituição para garantir a continuidade da educação de povos das comunidades tradicionais. “É muito simbólico unir três marcadores sociais que sempre lutaram e foram ao enfrentamento por seus direitos, inclusive à educação. Hoje estamos aqui porque esses povos que lutaram antes de nós e conquistaram o espaço que apresentamos como campus dos povos originários e comunidades tradicionais em Jeremoabo”, afirmou a reitora, lembrando da fase de defesa e apresentação da proposta do Opará/Uneb ao CBHSF. “Quando o projeto foi apresentado, a questão era como o Comitê de Bacia poderia financiar um espaço educativo, uma universidade e o que permeou toda a discussão naquele momento foi a máxima de que não existe rio sem povo e não existe povo sem rio. Quem preserva os rios, as matas são os povos tradicionais e por isso é preciso ter recurso para a preservação dessas comunidades que vão cuidar do nosso meio ambiente. Nossa gratidão, enquanto universidade, pelo Comitê abraçar a proposta do Opará, concedendo recursos para a construção desse espaço”, concluiu.
Reitora fala sobre continuidade dos projetos
Com a nova instalação, o Opará continuará ofertando os cursos de Licenciatura Intercultural em Educação Indígena (LICEEI), Pedagogia Intercultural, Especialização em Gestão e Educação Intercultural Indígena (PGGEII), Mestrado em Estudos Africanos, Povos Indígenas e Culturas Negras (PPGEAFIN), além do curso de formação continuada de professores indígenas ‘Ação Saberes Indígenas na Escola’ realizado em parceria com o Ministério da Educação e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano.
O coordenador da CCR Médio São Francisco, Ednaldo Campos, destacou o benefício conquistado pelas comunidades, que representa um avanço no sentido de garantir a inclusão social. “Quando o projeto foi apresentado pelo coordenador do Submédio, Cláudio Ademar, eu defendi com unhas e dentes porque sei o quanto foi e é difícil o acesso à educação de qualidade e por isso, precisamos apostar e investir em projetos que garantam, principalmente aos povos tradicionais, oportunidades. Esse projeto é de fundamental importância, pois se trata de inclusão social. Sinto-me feliz por todos que estão sendo diretamente beneficiados”, afirmou.
Comunidades tradicionais em festa
A professora indígena Angela da Cruz Batista, da etnia Kiriri Mirandela do município de Banzaê – BA, estudante da LICEEI, segunda geração da família a conquistar esse espaço, seguindo os passos de sua mãe, lembra as dificuldades vivenciadas pelas duas e que não deve mais ser a realidade do seu filho, por exemplo. “A luta para conseguir esse espaço é antiga, foram muitas as dificuldades enfrentadas, desde o deslocamento das nossas comunidades, de não ter onde ficar, e agora, a gente sabe que a realidade será diferente e nossos filhos já não enfrentarão o que precisamos passar para ter educação de qualidade. Esse campus é um espaço de pertencimento e vai contribuir na continuação da nossa formação, nos ajudando a avançar, garantindo desde já e para as futuras gerações um espaço maior, com mais cursos. O que estamos vivendo aqui é a continuidade do legado de muitos que nos antecederam. Nossa história e luta continuam garantindo nosso direito como cidadãos à educação, possibilitando que sejamos autores da nossa própria história, sob o nosso olhar, sendo parte ativa da construção”.
O presidente das comunidades quilombolas Baixa da Lagoa, Olhos D’água e Quelés, José Romildo de Jesus Santos, fez um paralelo com sua própria história quando não pode acessar a educação básica e sonhou em presenciar o que hoje já é uma realidade. “Eu tinha o sonho de não morrer analfabeto, usando o dedo para assinar e por isso só tirei minha identidade com 18 anos quando aprendi a escrever meu nome. Estudei até a quarta série do ensino fundamental e sonhava que as crianças da minha comunidade estudassem. Agora estamos conseguindo para essa região onde existem 21 comunidades quilombolas, um espaço para a formação de professores para ensinar nossos filhos e netos a educação quilombola, não a que está nos livros, mas a que realmente vivemos. Hoje me sinto realizado”.
O coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Cláudio Ademar, concluiu: “Hoje é um dia de festa e muita celebração para o povo que merece total reconhecimento do estado brasileiro e da sociedade. O Comitê, por entender que investir na educação é investir na proteção do rio São Francisco, vem construindo em conjunto com as comunidades tradicionais, há muito tempo, pois eles são os grandes defensores do rio e do meio ambiente. Esse investimento deve dar mais oportunidades, possibilitando aos que mais precisam estudar sem sair de casa”.
Após a entrega da escritura e assinatura do protocolo de intenções, a próxima etapa deve atender à elaboração do projeto.
Assessoria de Comunicação do CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Juciana Cavalcante
Fotos: Juciana Cavalcante