Bacia do Velho Chico está de quarentena

30/03/2020 - 18:55

Uma das armas mais poderosas no combate à disseminação do COVID-19 é, sem dúvidas, a informação de qualidade. Por isso, convidamos os nossos repórteres de todas as regiões da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco para nos relatarem como estão as medidas de contenção ao coronavírus e como está a situação da população na bacia do Velho Chico. Leia os relatos dos nossos jornalistas de Belo Horizonte, Três Marias, Pirapora, Salvador, Petrolina, Maceió e Aracaju.


Belo Horizonte

Por Luiza Baggio

Desde o dia 20 de março a capital mineira está de quarentena, dia em que começou a valer o decreto assinado prefeito Alexandre Kalil (PSD). A medida restringiu o funcionamento de vários estabelecimentos comerciais, como casas de shows, shoppings, academias, salões de beleza, entre outros, para conter o avanço do novo coronavírus (COVID-19). No caso de bares, restaurantes e lanchonetes, a norma é mais flexível, com as permissões de realizar vendas e entregas nos locais, desde que os funcionários manuseiem os alimentos e bebidas, além do delivery.

O Mercado Central, um dos pontos turísticos mais importantes de Belo Horizonte, mudou o funcionamento e vai ficar fechado aos domingos. Além disso, somente 110 (25%) das 400 lojas estão em funcionamento e, parte delas, atendendo apenas para entregas ou retirada no local. Os animais que ficaram em algumas lojas estão sendo tratados pela administração. Pequenos lojistas precisaram se reinventar para manter o estabelecimento em funcionamento: demitiram os funcionários e estão trabalhando com o sistema de delivery dos produtos.

Na Câmara de Vereadores de BH, 15% dos membros estão contaminados com coronavírus. Hoje, a Casa tem 40 parlamentares e seis deles atestaram positivo. O expediente foi suspenso por causa do avanço do coronavírus.

Na primeira semana de isolamento social, a disseminação da COVID-19 apresentou, no dia 25 de março, uma leve redução de casos novos, depois de um pico de diagnósticos positivos de acordo com os dados oficiais divulgados pelo Governo de Minas. O dia 18 de março marca a primeira medida de isolamento social adotada por recomendações médicas e implementada pelo governo de Minas e pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). Por isso, checar a evolução dos casos a partir dessa data pode dar uma primeira impressão da importância que o afastamento traz para evitar a transmissão do coronavírus.

O pico de casos novos confirmados em Minas Gerais ocorreu nos dias 21 e 23, com 36 diagnósticos positivos divulgados em cada um desses dias. Nas mesmas datas, a capital mineira – que concentra o maior número de doentes no estado – também registrou picos de confirmações: 25 em cada uma das duas datas.

Atualmente, segundo o boletim da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) do dia 26 de março, o estado registra 153 pessoas com confirmaçãoda infecção, nenhum óbito e 17.409 casos em investigação.


Três Marias

Por Paulo Emílio Bellardini

Em Três Marias, na região do Alto São Francisco em Minas Gerais, a prefeitura publicou vários decretos na medida em que o número de casos suspeitos de contaminação pelo Coronavírus foi aumentando em todo o país. O primeiro decreto foi publicado em 16 de março e declara Situação de Emergência em saúde pública no município. O segundo instituiu o Comitê Gestor do Plano de Prevenção e Contingenciamento em Saúde do Covid-19.

O Decreto nº 3.000/2020 fixou medidas de saúde pública necessárias para a prevenção, controle do contágio e o tratamento das pessoas afetadas no âmbito do município de Três Marias. Entre as medidas tomadas estão a suspensão por tempo indeterminado de diversos serviços como atividades na rede pública de ensino, eventos, fechamento do comércio, exceto os de alimentos, que devem cumprir várias orientações. O decreto também proíbe o acesso ao Terminal Turístico Praia Mar de Minas.

A Praia Mar de Minas, administrada pela prefeitura, está localizada às margens da represa de Três Marias, que atingiu nesta semana 100% de sua capacidade, segundo informações da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). A última vez que o reservatório alcançou sua capacidade total foi há 11 anos. O local recebe turistas de várias cidades da região e principalmente da capital mineira. Os decretos 3.000 e 3.001/2020 determinam ainda a interdição de vias públicas de acesso à praia e suspende o uso da área de camping, a entrada de ônibus de excursão, micro-ônibus, vans e similares no local. A medida suspende ainda os passeios de barcos, lanchas e a realização de esportes aquáticos, com embarque e desembarque na orla do lago de Três Marias. A exceção é para os pescadores que utilizam a pesca no Lago para subsistência.

O decreto nº 3.005/2020, publicado na segunda-feira (23/03) determina o toque de recolher até o dia 6 de abril, das 20h às 06h do dia seguinte, para confinamento domiciliar, obrigatório em todo o território do município, proibindo a circulação de pessoas neste horário. O último boletim divulgado pela prefeitura informou que existem oito casos suspeitos no município e nenhum confirmado até o momento. A equipe de saúde municipal aguarda o resultado os exames, que foram enviados para Belo Horizonte.


Pirapora

Por Tiago Rodrigues

Em Pirapora/MG o Rio São Francisco vive duas realidades distintas. De um lado as chuvas em abundância trouxeram um cenário otimista para os ribeirinhos e demais moradores. Por outro lado, as medidas adotadas pelo Decreto de nº 117, publicado pelo município, que estabelece medidas de prevenção e enfrentamento contra a pandemia Coronavírus – COVID19, deixou pescadores e outros trabalhadores autônomos, que dependem do rio para tirar o sustento, preocupados.

Hoje, a barragem de Três Marias está com 99.5% de sua capacidade. Somado este volume a um período favorável de chuva, o rio vem se recuperando, principalmente na quantidade de peixes.

Para o pescador Márcio Reis seria um momento de muito trabalho, que, consequentemente, melhoraria a renda de quem vive do rio. “No final de janeiro quando acabou o período da piracema, o rio já estava com um volume bom. Houve até receio de enchente, mas ele se normalizou mantendo a calha cheia, ideal para a pescaria. Tanto que não posso reclamar, pesco no encontro do Rio das Velhas com São Francisco, mas essa doença que chegou no país atrapalhou. Não estamos impedidos de pescar, porém, o receio é muito grande. Podemos adoecer ao sair para trabalhar, mas podemos ficar sem comida na mesa se não trabalharmos”, argumentou Reis.

Em coletiva recente, o 2° Tenente da Marinha, Thyago Webert, da Capitania Fluvial do São Francisco, ao lado de outras autoridades do município de Pirapora, reiterou as medidas de combate ao COVID-19. “Essa é uma batalha de todos. O município hoje dispõe de um Comitê de Enfrentamento da epidemia COVID-19, que resultou na criação do Hospital de Campanha, que em breve estará atendendo. Além disso, estamos atentos ao Rio São Francisco, sempre que possível passamos orientações aos ribeirinhos, nossa recomendação é para não sair de casa e navegar no rio apenas em casos extremos”, explicou Webert.

Na visão do ribeirinho, Raimundo Santana, a suspensão do funcionamento dos comércios prejudicou geral. “Eu vivo da pesca e minha esposa tem uma pequena lavoura. Precisamos vender se não perdemos todo o investimento. O peixe ainda tem uma pequena saída, mas também tem o preconceito. Dizem que sou do grupo de risco por ter mais de 60 anos, porém, na minha visão, o único risco que corro neste momento é ficar sem o básico para sobreviver”.


Salvador

Por Andréia Vitório

Atrás do Ceará, a Bahia é o segundo estado do Nordeste com o maior número de infectados pelo novo coronavírus. Até às 17 horas do dia 27 de março, eram 19 municípios com pessoas que testaram positivo e 123 casos confirmados, sendo 78 em Salvador, de acordo com a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia. Dezesseis pacientes foram curados. Nenhuma morte confirmada.

Aquela Salvador efervescente e pulsante dá lugar ao silêncio de suas ruas vazias. Nem a praia escapa, as principais da cidade foram interditadas, a exemplo do Porto da Barra, assim como o Elevador Lacerda, cartão-postal da cidade. E tem mais: para frear o avanço da Covid-19, o governo do Estado determinou o fechamento de rodoviárias de 26 municípios, colocou barreiras em estradas e aeroportos, suspendeu travessias por ferry-boats. Além do fechamento dos shoppings e centros comerciais, seguem suspensos aulas, eventos, cinemas, bares e restaurantes, que só podem funcionar por meio do delivery.

A profissional de varejo de um dos maiores shoppings da capital baiana, Geide Lima, de 47 anos, viu sua rotina mudar completamente. “Concordo com o isolamento social. Há 10 dias não saio de casa, o que é difícil para mim, que sempre tive uma vida agitada no trabalho e na vida pessoal”. A baiana, que também é capoeirista, conta que está fazendo sua parte para conter o avanço do vírus e que tem buscado cuidar da cabeça e do corpo.

Ao contrário de Gleide, a atendente de telemarketing O. N. S, de 59 anos, que prefere não ser identificada, não foi liberada do trabalho. Mas, garante, o trajeto é só da empresa para casa. Agora, mais cuidadosa, deixando os sapatos do lado de fora, com atenção redobrada com a higiene e mais severa com a economia da água, medidas que devem permanecer mesmo após a quarentena.


Petrolina

Por Juciana Cavalcante

Com 42 casos do Covid-19 confirmados em Pernambuco, a região do Vale do São Francisco registrou as primeiras confirmações nessa segunda-feira (23). Até o momento há dois pacientes com o coronavírus em Juazeiro, norte da Bahia e um caso em Petrolina – PE. Os governos municipais já vinham se preparando para esse momento e adotando medidas cada vez mais restritivas com o intuito de adiar ao máximo a chegada da doença à região, que além do Covid-19 também vem registrando um aumento de infectados pelo H1N1.

Iniciando com medidas que proibiam a aglomeração de mais de 100 pessoas, agora não devem ser mais permitidas reuniões com até 10 pessoas. As escolas e universidades estão sem aulas presenciais há pelo menos duas semanas. As feiras livres, igreja, biblioteca, shopping, museu, comércio, bares e restaurantes também estão fechados. Nas ilhas, atrativos turísticos e de lazer local também não é permitido mais o acesso. Somente as farmácias e supermercados podem funcionar e com limitação de pessoas realizando compras. Os passageiros que chegam ao aeroporto Senador Nilo Coelho têm a temperatura conferida por profissionais da secretaria de saúde. Nos bancos, somente 50 pessoas entram por vez e é aí que está um dos desafios. Enquanto somente 50 pessoas entram nas dependências dos bancos, as filas do lado de fora são gigantes, sem respeito do espaço mínimo de um metro entre cada indivíduo.

Após denúncias de aglomeração, a Orla de Petrolina também passou a receber a fiscalização dos agentes de segurança. O sistema de trabalho em casa, home office, foi aderido por boa parte das empresas e instituições públicas. E por último, o São João de Petrolina que já chegou a reunir até 100 mil pessoas em uma única noite, foi suspenso. O recurso já foi redirecionado para o combate ao coronavírus. Outras cidades no entorno, onde já há casos suspeitos sob monitoramento, as fronteiras estão com barreiras que auxiliam na verificação da procedência de cada pessoa que tenta entrar na cidade, é o exemplo de Afogados da Ingazeira, Araripina – PE e Paulo Afonso – BA.

Em Itacuruba-PE, a cacique Cícera Cabral, membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco anunciou durante o último final de semana que a tribo Serrote do Campos está fechada para visitações. “A tomada de decisão para recomendar a suspensão das visitas ao nosso território, foi pensando em prevenir os nossos indígenas e familiares de propagar ainda mais essa pandemia. Também realizamos através de redes sociais, a conscientização da comunidade, pois sabemos que o momento em que vivemos é de extrema cautela, mesmo porque o País lida com algo invisível e mortal e nós somos vulneráveis. Além de sermos uma comunidade que não dispõe de recursos e nem estrutura para enfrentar tal pandemia. Então, a forma mais coerente é nos isolarmos para driblar essa pandemia e pedir aos nossos encantados a proteção necessária e conscientização da gravidade do momento”, explicou a cacique.


Maceió

Por Deisy Nascimento

Em Alagoas, após o decreto de emergência do governo do estado, que teve o apoio da prefeitura de Maceió, para fechamento de estabelecimentos de serviços não essenciais diante pandemia do COVID-19 (cononavírus), o isolamento social e a quarentena tem sido cumprido por parte da população. Se por um lado, há aqueles que seguem à risca as regras para minimizar o contágio, também existem pessoas que não acreditam ou ignoram a força dessa pandemia. Diante de tais medidas, Alagoas encontra-se até o momento entre os estados com menos infectados pelo vírus. Além do decreto, o governador Renan Filho, anunciou a entrega de 1 milhão de cestas básicas que serão distribuídas entre os beneficiários do Bolsa Família e a antecipação do 13º salário para aposentados da primeira faixa salarial da rede estadual. Entretanto, alguns empresários locais estão em situação de desespero por não terem como pagar seus funcionários e outras contas e pedem a liberação para o funcionamento dos seus estabelecimentos para assim evitar demissões.

De acordo com a psicóloga e presidente do Conselho Regional de Psicologia em Alagoas, Zaíra Rafaela Lyra Mendonça (CRP-15/2558), o contexto de uma pandemia mexe com tudo o que de humano as pessoas têm. “Mexe com a nossa convivência, coletividade, contato com a natureza. Mas, é importante entender que esse é um movimento mundial vivenciado por todos. Precisaremos encontrar estratégias de enfrentar de uma maneira que reduza danos e que possamos estimular a saúde mental. A nossa relação de humanos com a natureza faz com que a gente sinta falta desse contato com ela contemplando emoções, afetos, expectativas e sentindo-se parte de um todo. Com certeza esse isolamento social vai provocar mudança abrupta de comportamento. Eu entendo que será necessário estimular as pessoas a experimentarem as sensações de forma precavida, respeitando as normas de segurança da Organização Mundial de Saúde, mas principalmente levando em conta que, o quanto antes a gente se isolar, mas rapidamente o vírus não irá se reproduzir e teremos a solução do problema de forma mais eficaz. Só assim poderemos voltar a ter contato com a natureza e a possibilidade de fazer parte do ecossistema de forma saudável”, explicou.


Sergipe

Por Carolina Leite

Em Sergipe, as ações de enfrentamento ao Coronavírus tiveram início no dia 16 de março, logo após o diagnóstico do primeiro caso na capital. As medidas estaduais incluem o fechamento de escolas e faculdades, comércio em geral, bares e restaurantes – funcionando apenas em delivery -, shoppings center, entidades religiosas, entre outros. Além disso, também está decretada a proibição da circulação de transporte interestadual, público e privado, de passageiros com origem em todos os estados da Federação em que a circulação do vírus for confirmada ou tiver situação de emergência decretada. Até o momento, o menor estado brasileiro já diagnosticou 16 casos da doença.

Desde o último dia 18 de março, as atividades de passeio no cânion do rio São Francisco também estão suspensas por 15 dias. A recomendação foi emitida pelo promotor de Justiça da Comarca de Canindé de São Francisco, Emerson Oliveira Andrade, entre os estados de Sergipe e Alagoas, destinada aos responsáveis pelo Complexo Turístico de Xingó e o Restaurante Karrancas. A proibição de check-in em hotéis e pousadas de todo estado também contribui para a paralisação do fluxo turístico na região.

Já a Prefeitura de Poço Redondo, cidade situada às margens do Velho Chico, tomou medidas mais severas e decretou toque de recolher desde terça-feira, 24, sempre no período das 21h às 5h, exceto para pessoas e serviços essenciais, comprovadamente. As penalidades para quem descumprir a medida são: apreensão de veículos, condução coercitiva previsto no artigo 268 do Código Penal e multa no valor de R$ 500.

Até o momento, dos 16 casos diagnosticados no estado de Sergipe, dois foram identificados no município de Propriá, cidade ribeirinha do Rio São Francisco: mulher de 36 anos que teve contato com caso confirmado e mulher de 44 anos que estava na lista de passageiros de um voo com casos suspeitos.

Além disso, com o decreto do Governo de Sergipe para a proibição da entrada de veículos de transporte de passageiros que chegavam de outros estados, a Polícia Militar sergipana tem feito bloqueios em sete pontos do estado, onde há rodovias e também transporte de balsas, entre eles, estão as cidades banhadas pelo rio São Francisco, como as cidades de Neópolis, Canindé de São Francisco, Poço Redondo e Propriá.

 

Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social