Isolado há mais de um século, desde os idos do ciclo do ouro, o quilombo Fortaleza, no oeste da Bahia, ganhou uma via de acesso de 31 quilômetros, ligando a comunidade à BA-160, financiada pelo CBHSF
Texto: Karla Monteiro e Fotos: Marcelo Andrê
Aos 39 anos, Bartolomeu Oliveira, enfim, viu o sonho de várias gerações se realizar: a inauguração de uma estrada ligando a sua casa ao mundo. Ele nasceu no quilombo Fortaleza, a pouco mais de 50 quilômetros de Bom Jesus da Lapa, a cidade da fé, no oeste baiano. Desde que se entende por gente, as 120 famílias que ali têm raízes profundas, remetendo ao ciclo do ouro, quando o Velho Chico era o caminho para o mar, sofriam com o isolamento, com a dura vida fisicamente a parte de tudo. Para sair do quilombo, fundado há mais de um século, reconhecido em 2012, era preciso enfrentar duas horas de remo contra a correnteza do rio São Francisco para se chegar à Gameleira, o povoado mais próximo.
“Pelo rio, eram duas horas, seis quilômetros no braço do remo. Por terra, só de carro de boi, que se podia contar três horas de relógio. Isso apenas para conseguir pegar uma condução para Bom Jesus”, contou Bartolomeu, sentado no quintal da sua casa, à sombra de uma das raras árvores frondosas daquele árido entorno.
A estrada de 31 quilômetros, ligando o quilombo Fortaleza à BA-160, foi construída pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), dentro do projeto de recuperação hidroambiental da bacia do riacho Santa Rita. Com duração de 10 meses, o projeto investiu mais de um milhão de reais em obras, como 32 “barraginhas” para contenção de água da chuva. A parte mais importante da empreitada, porém, dera-se no contato com os moradores.
A estrada construída pelo CBHSF liga o quilombo à BA-160
“O engajamento dos ribeirinhos é muito importante. O São Francisco se encontra em situação de penúria, aqui e em toda a sua extensão. Precisamos, todos juntos, exigir maior atenção ao que está acontecendo”, disse Ednaldo Campos, coordenador da Câmara Consultiva Regional (CCR) Médio São Francisco.
Nascido no quilombo, Bartolomeu Oliveira é um dos beneficiários do projeto. E para o coordenador da CCR Médio São Francisco, Ednaldo Campos, o sucesso do projeto depende da atenção e participação de todos
Da casa de Bartolomeu até a beira do rio, aprofundando-se na mata seca, sob a inclemência do sol, são 15 minutos de caminhada. Segundo ele, nascido e criado naquelas águas, o Velho Chico “tá fraco e enrrasou”.
“Antigamente eu passava uma noite e enchia um barco. Hoje, dois quilos no máximo. Surubim nem tem mais”, comentou. Para finalizar: “Mas agora é hora de festa. Nem sei quantos prefeitos eu vi prometer esta estrada”.
Confira o vídeo sobre a estrada construída para o quilombo Fortaleza