Membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), a professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Yvonilde Medeiros, apresentou hoje (20) um estudo de caso sobre o Rio São Francisco no Simpósio Internacional ‘O papel da ciência, tecnologia e inovação nos desafios globais da água’, promovido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações em parceria com a União Europeia. A ação integra a grade de atividades do 8º Fórum Mundial da Água, que acontece entre os dias 17 e 23 de março, em Brasília.
Doutora em Hidrologia pela University of Newcastle Upon Tyne – UK, mestre em Hidráulica e Saneamento pela Universidade de São Paulo e graduada em Engenharia Civil pela UFBA, Medeiros apresentou a palestra ‘Conflitos de uso: água para desenvolvimento e consumo humano’, destacando a problemática vivenciada na bacia do Velho Chico. “Convivo, tanto por meio de pesquisas na universidade, quanto na minha atuação no Comitê [da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco], com uma bacia marcada por grandes conflitos. Trata-se de uma região de grandes dimensões, diferentes características climáticas, de grandes oportunidades, riquezas, belezas, cultura muito forte, mas a superexploração dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos vem se tornando a cada dia mais acentuada”, conta.
Ela explicou que a escassez hídrica deriva tanto de questões físicas, decorrentes da falta de equilíbrio entre o balanço hídrico, em razão de baixa precipitação e demanda crescente, mas também por problemas ligados à gestão e governança. “Juntando tudo isso à problemática da agricultura, o cenário fica ainda maias grave, já que estamos falando de uma agricultura extremamente ineficiente, responsável pelo consumo de 80%, 85% das águas”.
As implicações dos reservatórios do setor energético nas vazões do São Francisco também foram pontuadas por Medeiros. “A necessidade de manter os reservatórios cheios condiciona as vazões de jusante, também chamadas de vazões de restrição mínima, cada vez mais mínimas. Quando a crise aumenta, a solução é cada vez mais reduzir a vazão que vai para o oceano como forma de manter os reservatórios cheios para atender o setor energético”, conta.
Medeiros também destacou que a problemática da escassez sempre afligiu a região Nordeste do Brasil, mas que o tema só ganhou importância à sociedade de maneira geral quando chegou às grandes cidades do país, como São Paulo e Rio de Janeiro. “Isso sempre foi considerado um fenômeno natural no Semiárido brasileiro. É claro que toda essa situação foi ficando mais acentuada na proporção que fomos ocupando de forma acelerada e desordenada as grandes cidades e a demanda por água, em termos de quantidade e qualidade, foi crescendo também. Mas, quando essa crise chega às grandes cidades, isso se tornou grave. Tão grave que a própria academia tem hoje uma preocupação muito maior com esse assunto”, afirma.
Ela também contou o que acredita ser necessário para equilibrar as demandas em torno da água na bacia do Velho Chico. “Precisamos de uma melhor gestão e que o ecossistema seja levado em consideração nesse processo. Além disso, devemos levar em consideração as pessoas que estão à margem das decisões e, também, a interconexão entre produção de energia e produção de alimentos, já que os pobres são os que tem menos resiliência às decisões que são tomadas pelos governantes. Quase nunca se pensa na quantidade de pobres que aumenta, na quantidade de favelas que aumenta a cada decisão [que reduz a vazão do rio consideravelmente], já que as pessoas perdem as suas formas de subsistência”.
Ao final, quando questionada pelos participantes sobre o polêmico projeto de transposição do Rio São Francisco, Medeiros foi categórica. “Já briguei muito por esse assunto, mas hoje não brigo mais porque esse assunto não é mais meu, não é do CBHSF, é da sociedade. A sociedade é quem vai pagar essa conta porque a transposição já está andando, independente de tudo o que foi feito pelo Comitê para barrar essa obra”, finalizou.
Veja as fotos do Simpósio:
*Texto: Luiz Ribeiro
*Fotos: Bianca Aun