“Quem deve decidir sobre um empreendimento dessa magnitude são as pessoas que serão afetadas”, disse a professora e coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Andréia Zhouri, durante a terceira edição do Seminário Usina Hidrelétrica (UHE) Formoso, realizado online na tarde do dia 25 de novembro. O evento é promovido pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) com o objetivo de ampliar o debate e dar visibilidade sobre o projeto.
A UHE Formoso, com potência instalada de 306 MW, está projetada para ser implantada no rio São Francisco, no estado de Minas Gerais, a 12 km da cidade de Pirapora (MG) e a 88 km da UHE Três Marias. A área de reservatório apresenta tamanho de 312 km2.
O presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, destacou sobre a necessidade de transparência ao processo de licenciamento da UHE Formoso, principalmente para as pessoas que serão diretamente impactadas. “O São Francisco não suporta mais esse tipo de empreendimento. Temos o Plano da Bacia que é um estudo desenvolvido com todo o rigor e critério que não prevê mais barramentos na bacia. O que o Velho Chico precisa é de revitalização. Contratamos um estudo que vai subsidiar o CBHSF nas discussões sobre os impactos da construção da UHE Formoso que será divulgado em breve”.
Para uma gestão sustentável da bacia, Anivaldo Miranda destacou a construção do Pacto das Águas. “A nossa prioridade deve ser avançar no Pacto das Águas, de forma a garantir a quantidade, a qualidade e o uso racional e democrático das águas. Esse é o caminho para termos uma gestão mais sustentável”.
Participaram do debate o representante da Quebec Engenharia, empresa desenvolvedora do projeto, Leôncio Vieira; a chefe da Assessoria Especial de Meio Ambiente (AESA), do Ministério de Minas e Energia (MME), Maria Ceicilene Aragão Martins; os pesquisadores do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL) da Eletrobrás, Leonardo Vieira e Ricardo Dutra; o representante da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), André Raymundo Pante e a coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (GESTA – UFMG), Andréa Zhouri.
Geração de energia e usos múltiplos
A terceira edição do Seminário UHE Formoso teve como tema a geração de energia e usos múltiplos. O gerente de desenvolvimento da Quebec Engenharia, Leôncio Vieira, iniciou as palestras apresentando a UHE Formoso no contexto de geração de energia e usos múltiplos. Ele mostrou como é a matriz energética pelo mundo. “A transição energética no Brasil se faz necessária. Existe uma necessidade de usinas com grande capacidade de armazenamento. As usinas hidrelétricas já existentes não conseguirão complementar a geração de energia”, disse.
Leôncio Vieira afirmou ainda que as usinas solares e eólicas não resolverão sozinhas a necessidade de energia elétrica do Brasil e acrescentou que as usinas hidrelétricas são boas opções para contribuir com a segurança energética.
Licenciamento
A representante do Ministério de Minas e Energia, Maria Ceicilene Aragão Martins esclareceu sobre o processo de licenciamento ambiental da UHE Formoso. “O projeto de Formoso foi incluído no Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica de 2029. O Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica (EVTE) está em andamento e os prazos estimados para o desenvolvimento do projeto permitirão sua inclusão no horizonte decenal do Plano”.
Ceicilene Martins explicou que atualmente o processo de licenciamento da UHE Formoso está sendo conduzido pelo IBAMA. “É importante esclarecer que a UHE Formoso ainda está em fase de licenciamento prévio e existem ainda muitas etapas entre a fase atual e o início da construção da usina, que só ocorrerá caso os estudos apontem a viabilidade técnica, econômica e ambiental do meio ambiente. São os estudos de engenharia ambiental que permitirão a tomada de decisão de forma embasada pelos órgãos responsáveis”.
Outras fontes de energia
Os representantes do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL) da Eletrobrás, Leonardo Vieira e Ricardo Dutra, abordaram sobre outras fontes de energia. Eles mostraram a diferença entre fontes de energia renováveis e não renováveis e a participação delas no Brasil e no mundo.
Energia renovável é gerada pelos recursos que são naturalmente reabastecidos e considerados inesgotáveis. Os esforços atuais se concentram nas energias eólica e solar, que são abundantes no Brasil.
Eles mostraram que a energia heliotérmica, conhecida como energia termo solar ou energia solar concentrada, avançou significativamente no Brasil e se tornou uma ótima alternativa para suprir a crise energética e desenvolver sistemas mais sustentáveis. A região de Petrolina, em Pernambuco, foi escolhida para receber a primeira usina de energia solar do país.
A energia heliotérmica é a geração de energia elétrica proveniente dos raios solares de maneira indireta, porque o calor do sol é captado e armazenado, para depois ser transformado em energia solar mecânica e, por fim, em eletricidade.
Análises técnicas de DRDH e outorgas para aproveitamentos
O representante da ANA, André Pante, levou ao debate as análises técnicas de Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica para Aproveitamentos Hidrelétricos (DRDH) e outorgas para aproveitamentos.
André Pante esclareceu que usina hidrelétrica é um uso sujeito a outorga. Além disso, mostrou que a DRDH é um documento que deve ser obtido previamente, junto à ANA (no caso de rios federais como é o São Francisco), pela autoridade do setor elétrico responsável pela concessão/autorização do uso do potencial hidráulico de determinado curso d’água para a implantação de aproveitamento hidrelétrico. Isto deve ocorrer no caso de aproveitamentos hidrelétricos que demandem quantidades consideráveis de recursos hídricos e que podem impactar de forma significativa a disponibilidade de água. Posteriormente, a DRDH é convertida em outorga em nome da entidade que receber, da autoridade competente do setor elétrico, a concessão ou autorização para uso do potencial de energia hidráulica.
Política energética, sustentabilidade e equidade socioambiental
A última palestra foi apresentada pela professora da UFMG, Andréa Zhouri, que mostrou a política energética, sustentabilidade e equidade socioambiental. Ela fez uma reflexão sobre sustentabilidade e hidrelétricas. “A noção de desenvolvimento sustentável reflete ambientalização entre o Estado e a sociedade há mais de 40 anos. Estaríamos vivenciando um contexto de retração no que se refere aos esforços para um consenso político em torno da ideia de desenvolvimento sustentável?”, contestou.
Andréia Zhouri apresentou sete mitos sobre usinas hidrelétricas e esclareceu que 1) Hidrelétricas não são fontes de energias renováveis; 2) Barragens não são baratas se comparadas a outras fontes de energia; 3) Pequenas hidrelétricas não são uma alternativa ambientalmente viável às grandes barragens; 4) O Brasil não precisa de novas hidrelétricas para enfrentar as crises energéticas no futuro; 5) Hidrelétricas não são necessárias para o desenvolvimento e a geração de emprego; 6) Barragens não são empreendimentos para usos múltiplos e 7) A energia hidrelétrica não é de utilidade pública.
“Precisamos de um modelo energético centrado na equidade socioambiental. Para isso, precisamos promover um amplo debate para que o cidadão possa, de fato, decidir sobre o destino do seu lugar e evitar processos que que produzem ecocídio (extermínio deliberado de um ecossistema regional ou comunidade) e etnocídio (destruição da cultura de um povo, em vez do povo em si mesmo)”, finalizou.
O Seminário UHE Formoso está disponível no canal do CBHSF no Youtube. Assista na íntegra:
Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio