Floresta no chão: 10 estados crescem em desmatamento e aumento chega a 400%

27/05/2021 - 8:00

Neste 27 de maio, Dia Nacional da Mata Atlântica, ouvimos especialistas sobre a realidade do bioma, suas principais demandas e os caminhos para mudar uma realidade desoladora


No primeiro ano da Década da ONU de Restauração de Ecossistemas (2021–2030) e a poucos meses da COP 26, o Dia Nacional da Mata Atlântica, um dos principais hotspots de biodiversidade do planeta, ganha ainda mais relevância. A seguir, especialistas e pesquisadores falam sobre as demandas mais urgentes, os caminhos necessários para mudar um cenário preocupante e a relação do bioma com o clima, a sociedade e os recursos hídricos.

Dados da SOS Mata Atlântica, divulgados ontem, 26 maio, revelam que, entre 2019 e 2020, o desmatamento da Mata Atlântica cresceu em 10 dos 17 estados que compreendem o bioma. Os piores números foram constatados em São Paulo e no Espírito Santo, que registraram mais de 400% de aumento em comparação ao ano anterior. No Rio de Janeiro e no Mato Grosso do Sul, o acréscimo foi de mais de 100%.

Números da devastação

 

Foram desflorestados, no total, 13.053 hectares (130 quilômetros quadrados). Apesar do número ser 9% menor que o levantado em 2018-2019 (14.375 hectares), os dados mais recentes representam uma elevação de 14%, quando comparamos com 2017-2018 (11.399 hectares), que foi o período com o menor valor da série histórica.

As informações são do Atlas da Mata Atlântica, realizado pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, unidade vinculada ao Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação (INPE/MCTI).

Também segundo o Atlas, entre 2018 e 2019, 71% do desmatamento do bioma ocorreu em apenas 100 dos 3.429 municípios cobertos pela floresta. Minas foi o campeão em devastação, reunindo 40 dos municípios que mais desmataram. Em seguida estavam a Bahia e o Paraná. Mesmo não figurando mais entre o TOP 3, eles seguem no topo do ranking do desmatamento.

A Superintendente da Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente (Amda), Maria Dalce Ribas, lista os principais pontos que colocam Minas Gerais, que é o estado com mais remanescentes de Mata Atlântica na Bacia do São Francisco, na relação de estados que mais desmatam: fabricação de carvão, especialmente para alimentar indústrias de ferro gusa que funcionam há décadas, atividades agropecuárias, mineração e expansão urbana em torno das grandes cidades.

Estamos perdendo, cada vez mais, biodiversidade, solo e água. Isso é disparadamente a maior tragédia ambiental do Estado, mas ela é silenciosa e os danos parecem imperceptíveis à sociedade, pois não têm impactos visuais como a ruptura de barragens,”
Maria Dalce Ribas, Superintendente da Amda

Hoje restam cerca de 12,4% da vegetação original da Mata Atlântica no Brasil. O número está bem abaixo do limite mínimo para sua conservação: 30%. A pressão sobre a floresta é grande: ela abriga 70% da população e responde por 80% da economia, abarcando grandes centros urbanos e indústrias, sendo responsável pela maior fatia da produção de alimentos no País. Não bastasse isso, a Mata Atlântica encontra-se restrita a espaços extremamente fragmentados e ocupa, em 80% dos casos, terras privadas. As informações são da ONG SOS Mata Atlântica.

 

Mudança climática

Renato Augusto Ferreira de Lima, Mestre em Recursos Florestais e Doutor em Ecologia pela Universidade de São Paulo (USP), reforça que os níveis atuais de devastação são preocupantes e que já são muitos os danos causados pela pressão das atividades humanas sobre os remanescentes. Ele frisa, por exemplo que “essas atividades já provocaram perdas de até 42% de sua biodiversidade e de 32% dos estoques de carbono florestal. Ou seja, o que sobrou da Mata Atlântica está bem aquém do seu potencial passado para abrigar espécies e estocar carbono.”

Ele destaca que ela é uma das florestas tropicais mais ameaçadas do mundo e com cerca de 30% de toda a população humana da América do Sul vivendo dentro de seus limites. Conservar ou restaurar a Mata Atlântica, aponta, tem repercussões tanto locais quanto globais no que se refere à conservação da biodiversidade e à provisão de serviços ecossistêmicos essenciais à vida humana, como a regulação climática.

Sim, entre tantos benefícios, a restauração do bioma se entrelaça também com a pauta do clima. Para o enfrentamento das mudanças climáticas rumo à 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, prevista para novembro de 2021, na Escócia, Malu Ribeiro, Diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, sinaliza que o Brasil precisa aumentar a ambição de redução de gases de efeito estufa e de contribuições que aumentam a temperatura. “Temos também que restaurar a Mata Atlântica e frear o desmatamento do Cerrado e da Amazônia”, frisa.

O que fazer para proteger

O geógrafo e coordenador-técnico do MapBiomas, Marcos Reis Rosa, conta que a Mata Atlântica está ficando mais jovem, o que não é uma boa notícia, e elenca o que deve ser feito para reverter a situação de hoje: “em primeiro lugar, frear o desmatamento, em especial das florestas mais antigas, que possuem maior biodiversidade e estoque de carbono. Em seguida, dar condições para a recuperação de florestas.”

Essa recuperação, explica, pode ser realizada de forma espontânea, com o retorno natural das florestas em áreas abandonadas, ou de forma ativa, com o plantio de espécies nativas.

Ele destaca, ainda, que a legislação permite que áreas de reserva legal das propriedades sejam recuperadas incluindo uma parte de espécies com valor econômico, o que contribui para a adoção de modelos onde pequenos produtores possam conseguir retorno financeiro com a restauração.

Cena de rio em meio à mata atlântica.

A mata e o rios

Proteger as matas é também cuidar dos rios. A Mata Atlântica, por exemplo, exerce o papel de regulador do clima, além de conservar o solo e as nascentes, especialmente as do Velho Chico, em Minas Gerais.  “Ela garante a saúde do rio e ajuda a manter sua perenidade. No caso do São Francisco, faz ainda o controle do adentramento da água salgada na foz,” aponta Malu Ribeiro, da SOS Mata Atlântica.

O CBHSF em ação

Em julho de 2017, o CBHSF, a Agência Peixe Vivo (APV) e o Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (IEF-MG) assinaram um Termo de Cooperação Técnica para a produção de mudas florestais em um viveiro existente no município mineiro de Patos de Minas.

A implantação do sistema de irrigação no local, iniciada em setembro de 2020, já está em fase final e entrará no período de testes. “A proposta é que as mudas produzidas sejam utilizadas pelo Comitê para a recuperação de áreas consideradas estratégicas para o Alto São Francisco no que concerne à disponibilidade hídrica,” explica Rayssa Balieiro Ribeiro, coordenadora técnica da APV.

Também são objetivos dessa recuperação: preservar os recursos hídricos, incrementar a qualidade e a quantidade dos recursos hídricos da paisagem, da estabilidade geológica e da biodiversidade, além de facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

Viveiro de Mudas em Patos de Minas

 


Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Andréia Vitório
Fotos: Acervo SOSMA e Rayssa Balieiro/Divulgação