Marcelo Ribeiro é advogado e membro da Câmara Técnica Institucional e Legal (CTIL) do CBHSF. Especialista em Direito Ambiental, já foi Procurador Chefe do IBAMA em Alagoas e hoje atua como consultor jurídico de prefeituras na área ambiental, além de ser membro da Comissão de Meio Ambiente da OAB/AL e representante da OAB no CBH do Rio Piauí/AL. Nessa entrevista, Marcelo divide conosco um pouco de seu vasto conhecimento.
– A grande questão ambiental atualmente são as mudanças climáticas, especialmente o aquecimento global. O que é esse fenômeno e de que forma impacta na sociedade, na economia e na vida do planeta?
O final da II Guerra Mundial é um marco histórico na mudança comportamental da humanidade, em que padrões de consumo foram drasticamente alterados e o chamado estilo americano de vida (american way of life) tornou-se hegemônico no Ocidente, transformando a sociedade em uma sociedade de consumo, o que resultou em profundo impacto nos recursos naturais do planeta. Desde então, o uso de combustíveis fósseis vem alterando o equilíbrio climático, resultando no efeito estufa, em que gases, principalmente metano e dióxido de carbono, encapsulam a radiação solar e impedem a sua dissipação no espaço, tal como ocorria há milhões de anos. Isso vem provocando o aumento da temperatura na Terra, cujos efeitos vão desde a perda da biodiversidade, elevação do nível dos oceanos em função do derretimento das calotas polares, perda de solos agricultáveis, ondas de calor nas megalópolis, aumento no movimento migratório decorrente dos refugiados ambientais, ocorrência cada vez maior de eventos climáticos extremos como furacões, enchentes, secas severas, tudo isso provocado por ações antrópicas (do homem). Estes efeitos atingem principalmente as pessoas de menor poder aquisitivo, com menos condições de resiliência frente a um mundo hiperpovoado e dotado de poucos recursos naturais para atender à crescente demanda, especialmente por água, alimentos e moradia digna.
– De acordo com dados do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens e Satélites (LAPIS), ligado à Universidade Federal de Alagoas (Ufal), 12,85% do semiárido brasileiro enfrenta o processo de desertificação. O que vem causando esse fenômeno?
Entende-se por desertificação a degradação da terra nas regiões áridas, semiáridas e do subúmido seco decorrente de ações antrópicas. No Brasil, uma imensa faixa territorial que abrange os nove estados nordestinos, além do Norte de Minas e do Espírito Santo, está susceptível à desertificação. Este fenômeno vem sendo estudado desde a década de 50, no Nordeste. Todavia, com a crescente perda da cobertura vegetal nativa, substituída por culturas agrícolas e pastagens, o processo de desertificação se acentuou no Brasil, acompanhando uma tendência mundial de perda das áreas florestadas, deixando os solos expostos à radiação solar, potencializando os efeitos provocados pelas mudanças climáticas.
– O que o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco vem fazendo em relação a isso?
O Plano de Bacia do Comitê do São Francisco dedicou uma atenção especial ao semiárido, justamente por reconhecer a sua importância estratégica enquanto parcela maior da bacia sanfranciscana, e vem atuando fortemente em projetos voltados ao uso sustentável dos recursos hídricos, construção de cisternas superficiais e subterrâneas de acumulação das águas das chuvas, recuperação de nascentes, incentivo ao plantio de vegetação nativa, educação ambiental, apoio na construção de políticas públicas locais voltadas à variável ambiental, capacitação de atores locais, a fim de que os instrumento legais possam ser utilizados em benefício da coletividade. O CBHSF incorporou a filosofia de que é impossível combater a seca. O que se pretende é o convívio sustentável com as inevitáveis secas, de tal forma que os impactos provocados pela falta de chuvas regulares sejam mitigados mediante o uso racional da água. O desafio é imenso e complexo, proporcional ao tamanho da bacia do Rio São Francisco e os milhões de seres vivos que dele dependem para sobreviver, mas temos a certeza de que estamos no caminho certo e os bons frutos deste trabalho já podem ser colhidos em diversas comunidades que foram beneficiadas pelo trabalho do Comitê, cujas ações, repita-se, são demonstrativas em razão dos parcos recursos que dispõe comparado à magnitude dos problemas.
– Em poucas palavras, que mensagem você passaria para os nossos leitores sobre a importância da luta contra as alterações climáticas?
Deixo a mensagem de que, se os negacionistas das mudanças climáticas tiverem razão, e que não haja de fato aquecimento global e que tudo faz parte de um processo natural de variação da temperatura, afirmo que, mesmo assim, comungo da tese do “no regret” (sem arrependimento), na medida em que não causará prejuízo algum à humanidade agir de forma cautelosa em relação à pegada ecológica. Reduzir o consumo de bens materiais e, por consequência, o extrativismo dos recursos naturais, muitos deles finitos e indispensáveis à sobrevivência humana, adotar práticas sustentáveis, diminuir a produção de resíduos e incentivar a reciclagem, buscar a cooperação mútua e abdicar do individualismo, são algumas atitudes essenciais para que possamos manter o equilíbrio ecológico e evitar o colapso da vida em todas as suas formas. Afinal fica a pergunta: se de fato não existe mudança climática, que prejuízo teremos em incorporar os Princípios do Desenvolvimento Sustentável em nosso cotidiano?
Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Mariana Martins
*Produção: Luiza Baggio