Membros elegeram nova coordenação e conheceram o trabalho de Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) e seus desdobramentos junto a povos tradicionais da Bacia do São Francisco
Nem só de água se vive um rio. Faz parte dele diferentes povos que constroem, através dos tempos, suas histórias e modos de vida intrinsicamente ligados às águas e ao meio ambiente. A Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, que percorre diferentes realidades Brasil adentro, tem em seus povos – entre eles as comunidades tradicionais – a face de sua identidade, diversa por natureza. Foi para debater sobre temas relacionados à essas populações que membros da Câmara Técnica de Comunidades Tradicionais (CTCT) do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) se reuniram, em Salvador, nesta segunda-feira (05 de fevereiro). Na pauta, a revisão da deliberação que dispõe sobre atribuições, estrutura e funcionamento da CTCT; eleição para coordenação da Câmara e apresentação do trabalho de Fiscalização Preventiva Integrada (FPI), que contou com a participação do Ministério Público da Bahia.
Para o vice-presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, o encontro foi positivo. Ele ressaltou, também, a importância da CTCT, que passa agora por uma reativação. “ A Câmara Técnica de Comunidades Tradicionais tem uma relevância muito grande porque traz a realidade do povo da Bacia do São Francisco, apontando assuntos importantes que podemos discutir dentro do Comitê. Essa Câmara já teve um papel extremamente relevante na busca dos direitos dos povos tradicionais e agora está num processo de amadurecimento”.
Destaque do encontro, a apresentação do trabalho realizado com as comunidades tradicionais e seus desdobramentos no Programa de Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) ficou à cargo da Promotora de Justiça e Coordenadora do Núcleo de Defesa do Rio São Francisco (NUSF) do Ministério Público do Estado da Bahia, Luciana Khoury. Entre outros pontos, ela chamou atenção para a importância de se contemplar comunidades e povos tradicionais em operações de FPI, tanto do ponto de vista sociocultural, mas também, ambiental, numa equação em que os fatores são indissociáveis: “proteger comunidades e povos tradicionais é proteger o Rio São Francisco.”
Regularização fundiária, saneamento básico e impactos de grandes empreendimentos são os principais problemas identificados em operações de FPI na Bahia. Outra questão, no entanto, vem preocupando: “a violência no campo precisa entrar na pauta dessa Câmara temática. Para garantir seus territórios, as pessoas estão pagando com a própria vida”, alertou a promotora.
FPI
Ela destacou, ainda, que com a FPI tem sido possível interromper danos de forma imediata; mapear e conhecer reivindicações e demandas para resoluções futuras; e assegurar direitos de comunidades tradicionais – que seguem lidando com diferentes conflitos e disputas por água e terra. “Ter um diagnóstico, um relatório com vários órgãos atestando diferentes situações, ajuda na proposição de cobranças e desdobramentos concretos”, diz
Entre os exemplos, a promotora falou da atuação em Correntina, no oeste da Bahia, que vem sofrendo com problemas como grilagem e pistolagem, sem dizer da crise hídrica agravada pelas grandes captações para o agronegócio, colocando em risco a atividade secular de fecho de pasto.
Para além de fiscalizar e apurar denúncias, a FPI na Bahia, que reúne 31 órgãos parceiros, tem se preocupado com o ambiente de forma sistêmica, extrapolando a questão ambiental, contemplando os povos da Bacia do Rio São Francisco e suas identidades – indígenas, quilombolas, pescadores, geraizeiros, povos de terreiro, comunidades de fundo e fecho de pasto, entre outros.
Encaminhamentos
Foi definido hoje, a partir de eleição entre os participantes, o nome de Manoel Uilton dos Santos, indígena dos Tuxá, de Rodelas (BA), para a coordenação da CTCT. Rita Paula dos Santos Ferreira, da Associação Aroeira, de Piaçabuçu (AL), foi eleita como secretaria.
“Ao ouvir sobre o trabalho da FPI pude identificar realidades que vivo na minha região. Não sabia que Alagoas tinha essa iniciativa. É importante saber, ir atrás disso e buscar ajuda para as comunidades de lá”, comenta Rita. Sobre seu novo cargo na Câmara, diz que vai dialogar com diferentes povos, mas que espera, também, dar mais voz a ribeirinhos que não se enquadram em nenhuma categoria específica e que compartilham de mesmos problemas de comunidades tradicionais da Bacia.
Uilton dos Santos lembra que, apesar das singularidades de cada povo, algo os une: a resistência. Ao falar de sua nova atribuição, agora, como coordenador da Câmara, ele explica que buscará fortalecer as pautas das comunidades tradicionais, servindo de ponte entre população e Comitê. “Estou otimista de que vamos conseguir criar uma aliança entre os diferentes segmentos que compõem esta Câmara, para que assim seja possível avançarmos e conquistarmos resultados palpáveis para os povos da Bacia”, ressalta.
Hoje, foram sugeridos, também, data e local para o I Seminário dos Pescadores Artesanais da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco: 12, 13 e 14 de setembro deste ano, em Peneado (AL).
Quanto à participação dos povos e comunidades tradicionais no 8º Fórum Mundial da Água, que acontecerá entre os dias 18 e 23 de março, ficou decidido que seria recomendado dois nomes da CTCT ao Comitê. A decisão ainda será avaliada.
Deliberação
Na manhã desta segunda-feira, foi revisada a nova deliberação que dispõe sobre atribuições, estrutura e funcionamento da Câmara Técnica de Comunidades Tradicionais (CTCT). Entre as propostas, a sugestão de mudar o nome para Câmara Técnica de Povos e Comunidades Tradicionais. Foi proposta, também, a redação de novo inciso relativo às atribuições da Câmara: “recomendar à Direx que intervenha nas demandas apresentadas pela CTCT”, como forma de dar mais voz e autonomia aos seus participantes. A deliberação revisada e discutida seguirá para a Cetil e para a próxima plenária.
Foi aprovada, também, a data para a próxima reunião da CTCT: 03 de abril, em Salvador.
Confira as fotos da reunião
Por Andréia Vitório