O Programa Água Doce, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, beneficia cinco estados – Alagoas, Bahia, Sergipe, Pernambuco e Norte de Minas, levando qualidade de vida a cerca de 200 mil pessoas
A água é um direito humano. No semiárido brasileiro, no entanto,as comunidades rurais encontram dificuldades para ter acesso a esse bem fundamental. Fatores climáticos, sociais e políticos são responsáveis pelas torneiras secas.
O objetivo do Programa Água Doce é transformar essa realidade, promovendo o uso sustentável de águas subterrâneas e fornecendo água de qualidade para consumo humano. Desenvolvido pelo governo federal, o programa vem promovendo melhorias na vida de 482 comunidades, quase 200 mil pessoas que vivem na região do semiárido brasileiro.
Por meio da tecnologia de dessalinização aplicada em poços nas áreas afetadas pela escassez hídrica, a metodologia do programa tem um ciclo que respeita o meio ambiente e conta com a participação das próprias comunidades na sua gestão.
O programa é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), com o apoio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e Pesquisa Geológica do Brasil (CPRM).
Segundo o diretor substituto de Revitalização de Bacias Hidrográficas e Acesso à Água do MMA, Henrique Veiga, a viabilidade do programa provém de um acordo de gestão compartilhada entre governo federal, estados, municípios e comunidades, cada um com suas responsabilidades.
“Estamos falando da produção de uma água para consumo humano, no qual a própria comunidade define os usos dentro desse acordo de gestão. Normalmente essa água é usada para beber, cozinhar, muitas vezes para dar banho em recém-nascidos. Uma parte pode ir para uma fábrica de pipoca, uma escola, um posto de saúde, quem define a distribuição é a própria comunidade”, destacou Henrique.
A execução do Água Doce está associada a convênios do MMA com as secretarias estaduais de recursos hídricos e meio ambiente. Os estados ficam responsáveis pela contratação de empresas para execução. São 200 instituições envolvidas no processo. O valor para implantar o sistema fica em torno de 250 mil reais por unidade.
Na Bacia do Rio São Francisco, o Água Doce passa por regiões de Alagoas, Bahia, Sergipe, Pernambuco e Norte de Minas, os dois últimos ainda em fase de implementação. De acordo Veiga, um Índice de Condição de Acesso à Água orienta quais são os municípios prioritários para receber o programa.
“São levados em consideração fatores como altas taxas de mortalidade infantil, taxa de pobreza e baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)”, comentou.
Mobilização Social
A metodologia para mobilização social foi realizada pelo Laboratório de Sociologia Aplicada da UFCG. Questões de operação, distribuição da água, limpeza, tudo é debatido com as comunidades beneficiadas.
Segundo a consultora do programa, Solange Amarilis, o processo de mobilização é realizado com identificação de lideranças comunitárias e associações.
“Fazemos um diagnóstico prévio, sempre respeitando o saber das comunidades”, esclareceu ela.“Com o acesso à água as comunidades começam a desenvolver outras habilidades e possibilidades, por exemplo, junto com os pesquisadores da Embrapa, estamos vendo nas comunidades qual é a vocação delas, quais são os cultivos que podem atender suas necessidades”.
Sem sal
A tecnologia da dessalinização chegou ao Brasil na década de 90, mas só em 2003, com a implementação do Água Doce, foi reconhecida como alternativa para garantir o abastecimento de água das comunidades no semiárido.
“Nosso grande desafio foi a gestão dos sistemas, porque o rejeito produzido pelo processo de dessalinização, um concentrado salino, era jogado no ambiente sem nenhum tipo de cuidado, gerando degradação do solo e, em último caso, até desertificação daquelas áreas”, disse Veiga.
Segundo o técnico contratado pelo programa, Alexandre Saia, o semiárido brasileiro tem aproximadamente 200 mil poços perfurados e 60% deles são de águas salobras. “A água subterrânea se aloja em fissura nas rochas e em função disso ela carreia toda a salubridade dessa rocha, então ela normalmente é uma água carregada de sais”.
Ele esclareceu que os poços eram perfurados e abandonados nas regiões porque a água não era própria para o consumo. “Então surgiu a proposta de trazer essa metodologia que aproveitaria poços já existentes e implantaria o sistema de dessalinização para fornecer água para as comunidades e dar um destino ambientalmente sustentável para o concentrado que sobra”, disse Alexandre.
A Embrapa desenvolveu a metodologia de tanques para evaporação do concentrado, o sistema simplificado o lança para evaporação, para evitar que seja jogado no solo.
“Dependendo das características da comunidade ela pode ter condições de receber o sistema produtivo integrado, em que o concentrado é usado para criação de peixes, aprofundamento dos conhecimentos em plantas halófitas e nutrição de animais”, observou Alexandre.
“Um poço não dá conta de abastecer um sistema inteiro, mas ele abastece em média 400 pessoas numa comunidade, com 10 litros de água por pessoa, então já é uma quantidade razoável de água de excelente qualidade que se complementa com outras tecnologias, como a cisterna”, avaliou.
O equipamento é uma membrana que tem a capacidade de reter esse sal para que a água passe, ela retém vírus, bactérias, purifica a água, conservando apenas os sais essenciais ao elemento. Segundo os gestores do programa, esse é o método mais eficiente de purificação de água disponível na atualidade.
Premiações
Em auditoria de natureza operacional sobre políticas públicas e mudanças climáticas o Tribunal de Contas da União (TCU) reconheceu, em 2009, o Água Doce como medida e política pública a ser fortalecida no país.
Em 2016, a ONU Meio Ambiente identificou o programa como iniciativa de abordagem integrada para o desenvolvimento sustentável e combate à pobreza. A experiência foi levada para a Organização este ano e apresentada para um conjunto de países. O Água Doce também foi destaque no Congresso Mundial da Associação Internacional de Dessalinização (IDA).
“A dessalinização não é a solução para tudo, mas a nossa proposta é que ela seja somada a outras tecnologias. Incrementamos a quantidade de água para enfrentar uma crise que se espalha pelo Brasil todo”, concluiu Alexandre Saia.
Mais informações: http://www.mma.gov.br/agua/agua-doce
Por Priscila Atalla