Modelo a montante já foi banido em outros países. O presidente da Vale, Fabio Schvartsman, disse nesta terça-feira que a empresa vai paralisar todas as barragens de rejeitos de mineração do modelo a montante, o mesmo que desabou em Brumadinho e Mariana, ambas em Minas Gerais. O processo deve demorar de um e três anos. Especialistas elogiaram a decisão, mas chamam atenção para a queda de receita da companhia.
Com desmontagem de barragens, Vale vai paralisar produção de até 40 milhões toneladas de minério de ferro por ano, durante três anos. Isso representa 10% da produção total da mineradora. Será necessário paralisar a paralisação para poder fazer todo o processo de eliminar as barragens. Todas ficam em Minas Gerais.
Segundo Schvartsman, será necessário paralisar as operações de mineração nas proximidades dessas barragens.
— Elas estão inativas. A única maneira de fazer o descomissionamento é essa — explicou o presidente, acrescentando que os projetos para a ação estão prontos e serão enviados para licenciamento junto aos órgãos ambientais nos próximos 45 dias.
O executivo disse que não haverá demissões:
— Temos aproximadamente 5 mil trabalhadores nos locais das barragens. Esses 5 mil serão absorvidos no plantel da Vale, que é de 80 mil trabalhadores.
Segundo Schvartsman, o descomissionamento das barragens demandará um investimento de R$ 5 bilhões e, portanto, a mineradora já espera ter forte impacto financeiro.
— É um esforço inédito de uma empresa de mineração no sentido de dar resposta cabal à altura da enorme tragédia que tivemos em Brumadinho — afirmou.
A companhia também vai ter de reduzir a produção em cerca 10 milhões de toneladas de pelotas (pequenas bolinhas feitas a partir de minério de ferro fino, usadas na fabricação de aço). Em 2017, a Vale produziu 50,300 milhões de toneladas de pelotas.
Segundo o presidente da mineradora, há laudos de auditorias recentes dizendo que todas as estruturas estão em perfeita estabilidade.
A Vale utiliza barragem basicamente no chamado Sistema Sul-Sudeste, segundo analistas do mercado, concentradas em Minas Gerais. No “Quadrilátero Ferrífero”, em Minas, são três complexos de mineração: Itabira, Minas Centrais e Mariana. No sistema Sul, também em Minas, há o complexo Minas Itabirito, Vargem Grande e Paraopeba.
A área de Ferrosos, responsável pela gestão das barragens de minério de ferro, no Brasil, fechou 2017 com 150 barragens e diques destinados à contenção de rejeitos, sedimentos e água. Em relação à dimensão dos reservatórios dessas estruturas, 80% são considerados de pequeno porte, 14% de porte médio e apenas 6% de grande porte. Do universo das barragens de pequeno porte, 71% possuem reservatórios com volumes inferiores a 500 mil metros cúbicos. “No final do ano, a área de Ferrosos finalizou mais um ciclo de auditoria externa de suas barragens, onde 100% das estruturas auditadas tiveram sua condição de estabilidade física e hidráulica atestadas”, de acordo com relatório de Sustentabilidade da Vale.
O modelo a montante é uma tecnologia de construção comum em projetos de mineração pelo mundo, mas por ser uma opção menos segura já foi banida por países como o Chile . Ele permite que o dique inicial seja ampliado para cima quando a barragem fica cheia de rejeitos de minério, usando o próprio material descartado — uma lama formada por ferro, sílica e água — como fundação.
Segundo especialistas, ele é comumente usado por ser mais barato e ocupar menos espaço, mas tem mais riscos de romper devido à inexistência de uma base sólida.
A Vale informou que tinha 19 barragens do tipo a montante até o desastre de Mariana. Naquele momento, decidiu paralisar todas e iniciar o processo de “descomissionamento”, que esvazia o reservatório. Nove dessas barragens passaram pelo processo. O trabalho anunciado pela empresa será feito nos dez reservatórios restantes, inclusive de Brumadinho.
— A decisão da companhia foi que não podemos mais conviver com esse tipo de barragem. Tomamos a decisão de eliminar, acabar, com todas as barragens a montante, descomissionando todas elas, com efeito imediato. Para tanto, será necessário paralisar as operações de mineração em todos os sites (locais) que estão na proximidade dessas barragens. A única maneira de fazer o descomissionamento é fazer a parada — anunciou o presidente.
Fabio Schvartsman e diretores da Vale se reuniram por mais três horas com o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. O anúncio foi feito após o encontro.
O número de mortos chegou a 84 após o quinto dia de buscas. Ainda restam 276 pessoas desaparecidas. Das vítimas resgatadas hoje, três estavam em um ônibus que já havia sido localizado anteriormente e duas foram encontradas na região em que estava o refeitório da empresa.
Fonte: Jornal O Globo