Comunidades tradicionais e os usos múltiplos do Velho Chico

15/06/2021 - 17:34

“O rio São Francisco é muito importante para nós na preservação das nossas culturas e tradições. É lá que vivem os encantados de luz e sol”. É da forma mais simples e original que a pequena indígena da etnia Pankará, Mariah Nawê Brune Leal Cabral Assis, de 7 anos, define o rio São Francisco, cuja bacia corresponde a 8% do território nacional e banha 505 municípios, em seis estados (Minas Gerais, Goiás, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe), além do Distrito Federal.

Com uma extensão 2.863 km apresenta um perfil populacional diverso que trafega em uma linha de grandes contrastes, com áreas com elevados níveis de riqueza e densidade demográfica, enquanto outras localidades têm reduzidos níveis de renda. Também é nesse contexto que vivem os povos e comunidades tradicionais do rio São Francisco: quilombolas, comunidades de fundo de pasto, pescadores artesanais, ribeirinhos, sertanejos, vazanteiros, caatingueiros, geraizeiros, entre outros. As comunidades tradicionais representam grande parte dos mais de 16 milhões de brasileiros inseridos na bacia do Velho Chico e, apesar da sua antiguidade e importância, ainda não existe uma quantificação precisa dessa população.

De acordo com o Decreto 6.040, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, podem-se agrupar na categoria de comunidades tradicionais “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

Para os povos com vínculos sólidos com o Rio São Francisco, a natureza é essencial à vida, pois é do seu uso que se obtém o sustento e confere a eles sua identidade. “A importância do rio para as comunidades tradicionais é vital. Sem o rio não tem como essas comunidades se sustentarem. Como comunidade quilombola, que sou e represento, sabemos que nossa origem é de um espaço de resistência, de luta contra o escravismo. Então, as comunidades tradicionais, de uma forma geral, têm a mesma semelhança em relação à sustentabilidade onde se formavam grupos em lugares mais ermos, mas que tinham água e davam condições de viver como viviam na sua terra natal. Essas comunidades são fundamentalmente autossustentáveis por que sem água ninguém vive”, afirmou Manoel Ailton Rodrigues de Carvalho, de origem quilombola e representante da comunidade no Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. Também é presidente do CBH do Rio Salitre, afluente do Velho Chico.

Este ano, levando a todas as comunidades a mensagem de um Velho Chico Para Todos, a campanha Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico propõe ainda a reflexão sobre a importância de assegurar os múltiplos usos da bacia, que passam pelas necessidades da produção de alimentos, abastecimento humano e animal, produção industrial e a geração de energia.

“O Comitê tem adotado ações para a proteção do rio, buscando melhorar a quantidade e a qualidade da água oferecida para que haja abundância, e por isso todos os membros de comunidades tradicionais, povos essencialmente ligados aos usos da água para subsistência, têm, junto com todos os povos da bacia, o papel importante de atuação na preservação e conscientização para adotar práticas sustentáveis com relação ao plantio e outros usos preservando as matas e não lançando esgoto sem tratamento. O CBHSF fomenta projetos que passam ainda pela educação ambiental até a execução de projetos hidrossanitários, proteção e recomposição de nascentes”, enfatizou o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Julianeli Lima.

Além disso, especificamente quanto ao cuidado com as comunidades tradicionais que viveram dentro do processo histórico de condições de desigualdade, isolamento geográfico e/ou cultural, tendo pouco acesso às políticas públicas de cunho universal, o CBHSF criou em 2015 um espaço na sua estrutura de funcionamento, instituindo a Câmara Técnica de Comunidades Tradicionais (CTCT).

Entre 2013 e 2021 o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco desenvolveu diversos projetos voltados para as comunidades tradicionais da Bacia do Velho Chico e prevê ainda a elaboração de novas ações em mais localidades.

 


Assessoria de Comunicação CBHSF:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto e fotos: Juciana Cavalcante